Não devo tratá-lo como caro, e penso que nisto concordaremos, e talvez em mais nada. Tenho o desprazer quase diário de constatar a sua presença próxima desde que me aventurei pela primeira vez na Internet, já estando naquela altura bem acima da sua idade atual. Gabriel O Pensador, em música de uns dez anos atrás, disse que era mais fácil comprar maconha do que pão. Esbarrar no seu discurso, entretanto, é mais fácil do que achar maconha OU pão.
Às vezes você parece homem, às vezes mulher, o nome também varia muito, o que em regra faz com que eu simplesmente me esqueça do rótulo vinte minutos depois. Mas sempre posso localizá-lo, com a cara que assumir na ocasião, naquele fórum em que se fala que é normal chamar pejorativamente de baianos ou paraíbas todos os brasileiros que nasceram ao norte da cidade mineira de Nanuque, visto que a maioria deles têm uma inserção subalterna nas sociedades do Sul e do Sudeste e não se pode reprimir as "atitudes espontâneas" dos indivíduos. Clicando na primeira das páginas afins, verei seu perfil alternativo sustentar com fúria, ao longo de horas, que o idoso gay assassinado ontem pelo garoto de programa que contratou recebeu o que estava procurando, e que a Justiça deve cuidar do caso como assunto trivial, até porque o morto violava as leis da Natureza. Instalada no tópico logo abaixo, outra parcela de você condenará ao tratamento de cem pilhas de louça a feminista que protestou em frente às câmeras da Globo sacudindo as estatísticas sobre quantas mulheres espancadas pelos maridos foram internadas nos hospitais da sua cidade nos últimos cinco anos.
Suas contrapartes blogueiras, em milhares de versões, estarão defendendo o eventual bombardeio da aviação israelense contra algum alvo a quatro mil quilômetros de Tel Aviv onde supostamente existem simpatizantes do Hamas, e condenando a frouxidão do governo Obama nas relações com o Irã; pregarão quarteladas dirigidas por formandos da Escola das Américas, a favor de latifundiários e banqueiros, em qualquer país centro-americano no qual um partido de esquerda vença as eleições presidenciais e tente aprovar no Congresso tímidas emendas constitucionais a favor dos setores populares; imputarão a negros de todas as partes da América a responsabilidade integral por sua miséria e falta de oportunidades, tentando convencê-los da honra que têm de permanecer na cozinha em uma sociedade gloriosa, quando poderiam viver como selvagens da série Indiana Jones; anunciarão a falência econômica do Brasil (ou a da Argentina, ou a do Uruguai) cada vez que gráficos mostrarem no horário nobre da televisão que a massa salarial cresceu 1% nos últimos doze meses.
Sabemos bem que o seu clichê preferido é o de que os "perdedores", ao invés de se esforçar para progredir em condições desfavoráveis (como se a sociedade estivesse de pernas e braços abertos para acolher a todos em seus melhores espaços), se "vitimizam" e depositam as esperanças no socorro do Leviatã malvado.
Olhando o quadro de outro ângulo, percebo que a única vítima imaginária é você mesmo. Nascido no Brasil que disputava com Honduras, Serra Leoa e Botswana a taça da pior distribuição de renda do planeta, tem nostalgia dos tempos recentes em que pessoas das classes D e E se sujeitavam às piores condições de trabalho possíveis para lavar os pratos e as privadas da casa dos seus pais em troca de um salário mínimo ainda mais depreciado do que o atual. Sonha ver nos olhos de pobres conformados a mesma admiração desfrutada por seu avô há cinquenta anos por andar limpo, bem vestido e "falar bem". Tem na ponta da língua a ladainha liberaloide de que só no laissez-faire há crescimento (não importando quantos exemplos conheça do contrário), mas está muito mais preocupado com a salvação do seu status meio roto de principezinho de classe média do que com o desempenho macroeconômico do país. Em resumo, se sente acuado pelas conquistas dos que identifica como inferiores, mesmo que isto não implique em qualquer perda material para você.
Sei o quanto me tornarei desagradável pela sentença, mas o fato é que você é um anti cidadão, hostil a qualquer igualdade e, desta forma, constitui mais um tipo de pré-capitalista do que o burguês moderno que busca no espelho enquanto experimenta roupas de grife. Noto com estarrecimento e certa irritação que seus próprios pais, socializados em contextos mais adversos a mudanças, nem sempre lhe acompanham no reacionarismo. O seu melhor dos mundos talvez fosse a vida em um Estado caricato onde todos beijariam a mão de um carrancudo D. Pedro III (legitimando todas as hierarquias de nascimento em efeito cascata) e reviveriam relações sociais da Idade Média sob a batuta de pregadores que proclamariam a excelência moral do projeto, enquanto você exibiria seu carro novo para os pobres mortais a cada quatro meses.
É certo que, caso você tenha avançado até este ponto, já estarei associado a todos os espantalhos falecidos que habitualmente são usados pela direita, a cada derrota política sofrida, para anunciar um iminente genocídio. Porém, bem mais sádico do que o pior deles, não desejo a sua morte ou a sua prisão, tampouco que ganhe uma reles canelada no futebol ou no jiu-jitsu. Quero apenas ver o seu "programa social" naufragar por completo, que metade dos seus futuros colegas no mestrado ou na direção da empresa sejam ex-cotistas, que ninguém passe a sua roupa daqui a vinte anos por menos do que a diária praticada em Frankfurt, que seu filho curse uma faculdade de História ao lado do filho do boy que carrega as contas do seu pai para a fila do Bradesco. Neste cenário talvez você siga o cínico lema de Roberto Campos ("liberalismo, Galeão ou Cumbica") e promova uma boa diversão para a minha terceira idade, editando de qualquer cidadezinha do Kentucky ou da Nova Escócia uma página lotada de impropérios contra o inferno natal de que "fugiu".
Para fechar, deixo votos de grande insucesso na campanha que fará em 2014 para os "socialistas fabianos" do PSDB (o "mal menor"), e o meu abraço de urso.
Às vezes você parece homem, às vezes mulher, o nome também varia muito, o que em regra faz com que eu simplesmente me esqueça do rótulo vinte minutos depois. Mas sempre posso localizá-lo, com a cara que assumir na ocasião, naquele fórum em que se fala que é normal chamar pejorativamente de baianos ou paraíbas todos os brasileiros que nasceram ao norte da cidade mineira de Nanuque, visto que a maioria deles têm uma inserção subalterna nas sociedades do Sul e do Sudeste e não se pode reprimir as "atitudes espontâneas" dos indivíduos. Clicando na primeira das páginas afins, verei seu perfil alternativo sustentar com fúria, ao longo de horas, que o idoso gay assassinado ontem pelo garoto de programa que contratou recebeu o que estava procurando, e que a Justiça deve cuidar do caso como assunto trivial, até porque o morto violava as leis da Natureza. Instalada no tópico logo abaixo, outra parcela de você condenará ao tratamento de cem pilhas de louça a feminista que protestou em frente às câmeras da Globo sacudindo as estatísticas sobre quantas mulheres espancadas pelos maridos foram internadas nos hospitais da sua cidade nos últimos cinco anos.
Suas contrapartes blogueiras, em milhares de versões, estarão defendendo o eventual bombardeio da aviação israelense contra algum alvo a quatro mil quilômetros de Tel Aviv onde supostamente existem simpatizantes do Hamas, e condenando a frouxidão do governo Obama nas relações com o Irã; pregarão quarteladas dirigidas por formandos da Escola das Américas, a favor de latifundiários e banqueiros, em qualquer país centro-americano no qual um partido de esquerda vença as eleições presidenciais e tente aprovar no Congresso tímidas emendas constitucionais a favor dos setores populares; imputarão a negros de todas as partes da América a responsabilidade integral por sua miséria e falta de oportunidades, tentando convencê-los da honra que têm de permanecer na cozinha em uma sociedade gloriosa, quando poderiam viver como selvagens da série Indiana Jones; anunciarão a falência econômica do Brasil (ou a da Argentina, ou a do Uruguai) cada vez que gráficos mostrarem no horário nobre da televisão que a massa salarial cresceu 1% nos últimos doze meses.
Sabemos bem que o seu clichê preferido é o de que os "perdedores", ao invés de se esforçar para progredir em condições desfavoráveis (como se a sociedade estivesse de pernas e braços abertos para acolher a todos em seus melhores espaços), se "vitimizam" e depositam as esperanças no socorro do Leviatã malvado.
Olhando o quadro de outro ângulo, percebo que a única vítima imaginária é você mesmo. Nascido no Brasil que disputava com Honduras, Serra Leoa e Botswana a taça da pior distribuição de renda do planeta, tem nostalgia dos tempos recentes em que pessoas das classes D e E se sujeitavam às piores condições de trabalho possíveis para lavar os pratos e as privadas da casa dos seus pais em troca de um salário mínimo ainda mais depreciado do que o atual. Sonha ver nos olhos de pobres conformados a mesma admiração desfrutada por seu avô há cinquenta anos por andar limpo, bem vestido e "falar bem". Tem na ponta da língua a ladainha liberaloide de que só no laissez-faire há crescimento (não importando quantos exemplos conheça do contrário), mas está muito mais preocupado com a salvação do seu status meio roto de principezinho de classe média do que com o desempenho macroeconômico do país. Em resumo, se sente acuado pelas conquistas dos que identifica como inferiores, mesmo que isto não implique em qualquer perda material para você.
Sei o quanto me tornarei desagradável pela sentença, mas o fato é que você é um anti cidadão, hostil a qualquer igualdade e, desta forma, constitui mais um tipo de pré-capitalista do que o burguês moderno que busca no espelho enquanto experimenta roupas de grife. Noto com estarrecimento e certa irritação que seus próprios pais, socializados em contextos mais adversos a mudanças, nem sempre lhe acompanham no reacionarismo. O seu melhor dos mundos talvez fosse a vida em um Estado caricato onde todos beijariam a mão de um carrancudo D. Pedro III (legitimando todas as hierarquias de nascimento em efeito cascata) e reviveriam relações sociais da Idade Média sob a batuta de pregadores que proclamariam a excelência moral do projeto, enquanto você exibiria seu carro novo para os pobres mortais a cada quatro meses.
É certo que, caso você tenha avançado até este ponto, já estarei associado a todos os espantalhos falecidos que habitualmente são usados pela direita, a cada derrota política sofrida, para anunciar um iminente genocídio. Porém, bem mais sádico do que o pior deles, não desejo a sua morte ou a sua prisão, tampouco que ganhe uma reles canelada no futebol ou no jiu-jitsu. Quero apenas ver o seu "programa social" naufragar por completo, que metade dos seus futuros colegas no mestrado ou na direção da empresa sejam ex-cotistas, que ninguém passe a sua roupa daqui a vinte anos por menos do que a diária praticada em Frankfurt, que seu filho curse uma faculdade de História ao lado do filho do boy que carrega as contas do seu pai para a fila do Bradesco. Neste cenário talvez você siga o cínico lema de Roberto Campos ("liberalismo, Galeão ou Cumbica") e promova uma boa diversão para a minha terceira idade, editando de qualquer cidadezinha do Kentucky ou da Nova Escócia uma página lotada de impropérios contra o inferno natal de que "fugiu".
Para fechar, deixo votos de grande insucesso na campanha que fará em 2014 para os "socialistas fabianos" do PSDB (o "mal menor"), e o meu abraço de urso.