quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Mandela, Fidel e seus detratores mentecaptos


 
         Empenhado numa aproximação com o Ocidente, em 1987, o governo Gorbachev se afastava de antigos aliados dos soviéticos, como o MPLA, de Angola.  Aproveitando-se da conjuntura, os Estados Unidos de Ronald Reagan e a África do Sul (sob o apartheid) intensificavam seu apoio aos guerrilheiros direitistas da Unita, chefiados por Jonas Savimbi, que assim ampliaram seu controle sobre vastas áreas ao sul do território angolano.  Reunindo tropas no norte da Namíbia, os sul-africanos realizaram uma pesada ofensiva contra o MPLA em novembro do mesmo ano.  As forças governistas de Angola recuaram para a cidade de Cuito Cuanavale, situada em área de florestas.  A eventual queda daquela localidade deixaria todo o sul do país debaixo da ocupação sul-africana.  
           Sem contar com o auxílio soviético, o presidente angolano José Eduardo dos Santos pediu ajuda a Fidel Castro.  O dirigente cubano atendeu-o prontamente, enviando para Angola um general de sua confiança, Leopoldo Cintra Frías, que recebeu o comando na região meridional, e nove mil soldados, que desembarcaram no início de 1988.  O contingente cubano na África atingiu, então, a cifra de 50 mil homens.  Uma parte avançou para o norte, até as fronteiras com o Congo e Zâmbia, e outra tomou o rumo de Cuito Cuanavale.  


                                  Vemos Cuito Cuanavale na província de Cuando Cubango. 
          
            O ataque sul-africano àquele posto avançado, reforçado pela ação da Unita, ocorreu a partir de 14 de fevereiro de 1988.  Entretanto, após várias semanas de combates, as até então invictas forças armadas do apartheid foram batidas e retrocederam, abandonando Angola.  O enfraquecimento dos agressores teve desdobramento nas negociações que resultaram na independência da Namíbia, onde ascendeu ao poder a Organização do Povo do Sudoeste Africano (SWAPO), grupo guerrilheiro que antes fustigava a dominação racista¹.  Assumindo a presidência da África do Sul em setembro de 1989, Frederik de Klerk se viu obrigado a admitir a desmoralização interna e externa do regime e a afrouxar seus fundamentos, até promover, em 1994, o pleito que terminou com a eleição de Nelson Mandela. 


                                                        Soldados cubanos em Cuito Cuanavale 

                 

             Falecido Mandela, nos deparamos com uma intensa campanha de depreciação da sua imagem, efetuada por organizações muito bem articuladas, a julgar pela rapidez com que difundem "informação".  Mandela  é demonizado por não ter combatido com flores uma das ditaduras mais truculentas e irracionais que já existiram, e virtualmente por qualquer outra coisa, inclusive os atuais índices de contaminação por HIV da população sul-africana!  Esta orquestração desprezível dispõe do entusiasmo gratuito não só dos arautos de sempre, como também, no que diz respeito ao Brasil, de milhares de "pessoas comuns"; na maioria dos casos,  reacionários ressentidos que, lidando cada vez pior com as frequentes rejeições ao conservadorismo nas urnas, adotam uma postura de enaltecimento de tudo que vem da direita.  Inclusive o apartheid. 
            Um dos elementos centrais do "Dossiê Mandela" é a "denúncia" da amizade do ex-presidente da África do Sul com Fidel Castro.  Recuperando o contexto dos episódios que abrem esta postagem, tenho um gosto especial em transcrever as palavras que Mandela dirigiu a Fidel durante a visita oficial que fez a Havana, em julho de 1991:

"A derrota decisiva do exército racista em Cuito Cuanavale foi a vitória de toda a África... Possibilitou à África desfrutar a paz e estabelecer a sua própria soberania... [e] ao povo da Namíbia alcançar sua independência.  A derrota decisiva das forças agressivas do apartheid destruiu o mito da invencibilidade do opressor branco.  A derrota do exército do apartheid serviu como inspiração para o povo combativo da África do Sul"².
  
          Mandela, solto da prisão em fevereiro de 1990, na temporada seguinte voou até Havana para confraternizar com o povo que em boa parte foi responsável por sua liberdade, e com seus governantes.  Reconheceu, como em outras ocasiões, o papel de um exército popular e multirracial na derrocada do apartheid.  De quem "nossos" udenistas tardios gostariam que fosse amigo? Thatcher? Bush Senior? Carlos Menem? Não podem ser levados a sério.                   
1-Este processo é descrito com bom número  de detalhes em Richard Gott.  Cuba: uma nova história.  Rio de Janeiro: Zahar, 2006, p. 311 a 314.   
2- Gott, p. 313.  

       

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