segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Cinco mitos sobre a História da África

Joias da rainha núbia Amanishaketo, contemporânea do imperador romano Augusto 
 
 
        Escrevo inspirado na jornalista Christine Vrey, da Namíbia, que há alguns meses publicou a matéria Dez ideias erradas sobre a África, motivada pela notória falta de informação sobre o continente africano que prevalece nas sociedades ocidentais.  O texto foi divulgado em português em muitas páginas, entre elas
        Sabemos que no próprio Brasil, apesar das amplas e multisseculares influências culturais africanas, muitas pessoas creem que a África é um único país, habitado por selvagens, todos de pele negra ao extremo.  Sendo a contemporaneidade africana desconhecida em larga margem pela maioria, a História da África é ainda mais ignorada, apesar da legislação  que determina o seu ensino nas escolas do país.  O brasileiro médio, no máximo, retém as generalizações correntes sobre o tráfico negreiro.  Suas referências, portanto, giram em torno da figura do africano como elemento necessário ao funcionamento da plantation americana.  Apenas uma máquina de produzir artigos agrícolas, e não o colonizador involuntário identificado por muitos dos intérpretes clássicos do Brasil.     
        A desinformação sobre aquele continente nada tem de nova.  Podemos recordar as lamentações de Nina Rodrigues, formuladas há mais de um século, acerca da África que morria "em nossas cozinhas" sem que conhecêssemos sequer as suas línguas.  Este desinteresse, no século XXI, favorece o projeto dos segmentos da direita que pretendem estabelecer, ou restabelecer, um pleno alinhamento do Brasil com a aliança militar ocidental na política externa.  Para eles, convém a manutenção do estereótipo do africano primitivo, incapaz de esforço intelectual e necessitado da tutela estrangeira para escapar da miséria absoluta e das guerras "tribais".  Assim como convêm os estereótipos do árabe fanático e terrorista, do indiano faminto e descalço, do russo pérfido e truculento, do chinês devorador de cães e eternamente disponível para o serviço sujo e mal pago.
         Obviamente, uma tendência de longo prazo não será revertida por um artigo de blog.  Penso, porém, que investir na desmistificação sempre traz bons resultados; ao menos, perdem-se algumas virgindades políticas.  Selecionei, então, cinco das generalizações mais grosseiras que ouvimos (e eventualmente lemos) a respeito da História da África, comentando-as de acordo com uma bibliografia de fácil acesso.               
  1-Os africanos nunca foram capazes de desenvolver a escrita. As regiões que já faziam uso desta modalidade de comunicação antes da expansão colonial do século XIX importaram-na do mundo islâmico ou da Europa.   

      Mesmo que desconsiderássemos a escrita dos egípcios como africana, coisa que não faz sentido, a sentença seria um disparate.  Já no tempo que corresponde na Europa à Antiguidade Clássica, havia em Méroe, citada por Heródoto no século V a. C. como a "capital do reino dos etíopes", e situada no norte do atual Sudão, uma escrita cuja parte fonética foi decifrada pelo inglês F. I. Griffith entre 1900 e 1911.  Durante o reinado de Arcamani, que provavelmente governou Méroe no século III a. C., quando a República romana lutava contra Cartago pelo domínio do Mediterrâneo Ocidental, a chamada escrita meroíta substituiu quase por completo o egípcio antigo como língua impressa nos monumentos daquela região.  Ela comportava uma variante hieroglífica e outra cursiva, composta por um alfabeto de 23 sinais¹.  Também na área que hoje identificamos como o norte da Etiópia, no século III a. C., houve a reelaboração da grafia no sentido de uma aproximação com a língua autóctone, e um consequente afastamento do idioma arábico trazido do Iêmen (pré-islâmico, é claro), de onde os "etíopes" tinham recebido a escrita². 
              
2-Não havia organização estatal na África antes da ocupação pelas metrópoles europeias, a não ser, mais uma vez, nas regiões controladas por muçulmanos.

    Poderíamos novamente recorrer ao exemplo do Egito faraônico, citando inclusive a dinastia núbia que o governou em partes dos séculos VIII e VII a. C..  Na verdade, a existência de Estado, na África, esteve mais para regra do que para exceção.  
     O reino de Axum, sediado em terras da atual Etiópia, era uma potência regional respeitável no século III, que participava do comércio entre a Europa e a Ásia através do Índico e do mar Vermelho e fazia circular moedas de ouro, prata e cobre.  Numa campanha militar iniciada em 525, o rei axumita Calebe chegou a conquistar toda a Arábia do Sul, onde "colocou cristãos em todas as posições de mando³".


Moedas do reino de Axum, em circulação no século IV.

      Bem mais ao sul e muito mais tarde, no século XVI, quando os portugueses firmaram relações próximas com o reino do Congo, lidaram ali com uma monarquia complexa, na qual o rei partilhava a arrecadação dos tributos com governadores de província, que os redistribuíam entre os chefes de distritos e estes com os chefes de aldeia e com os "cabeças de linhagens"4.          

3-Antes da colonização europeia, todos os africanos, ou quase, viviam em pequenas aldeias formadas por casas de cômodo único.  

       Esta afirmativa é tão ou mais absurda do que a anterior.  O "país" dos ussá, que jamais foi unificado politicamente, abrangia diversas cidades-estados, localizadas na bacia do rio Níger: Kano e Rano, onde predominavam os tecelões; Katsina e Daura, cuja vida girava em torno do comércio; Zaria, dominada pelos mercadores de escravos.  Estes centros, cuja influência atingiu um apogeu por volta de 1350,  possuíam altas muralhas para evitar um eventual saque por parte das populações vizinhas.  Dois séculos mais tarde, Hassan ibn Mohamad, conhecido também como Leo Africanus, disse que os habitantes de Kano eram "artesãos civilizados e ricos mercadores"5.


                                                       Ruína da igreja Kulumbimbi, em M'Banza Congo, Angola

       Banza Congo, a capital do reino do manicongo, abrigava no final do século XVI entre 60 e 100 mil habitantes.  Somente o palácio real tinha 2.400 metros de circunferência6.
      Até na remota (pelo critério europeu) ilha de Madagascar, o reino do Boiná, formado no século XVII, concentrava em 1792, apenas em sua capital Majunga, seis mil comerciantes omanitas e hindus, estimulados pela integração nos circuitos comerciais da rede swahili do Oceano Índico.  A influência ocidental na ilha, por outro lado, só se intensificou a partir do reinado de Radama I do Ambohimango (1810-1828), que contratou europeus para modernizar o exército e promoveu a mudança da transcrição da língua malgaxe dos caracteres arábicos para os latinos7.    
           
 
4- Os africanos trazidos para a América a partir do século XVI eram todos prisioneiros de guerra que seriam mortos caso os europeus não os comprassem dos mercadores também africanos.

       O especialista Patrick Manning, em seu trabalho The enslavement of Africans: a demographic model (1981), demonstrou que a maioria das pessoas escravizadas na África permanecia dentro do próprio continente.  No circuito atlântico do tráfico, enquanto os "exportados" representaram 44,6% das amostras pesquisadas, a proporção dos que ficaram foi de 55,4%.  Destes, o autor calculou que pereciam em torno de 10%, abatidos por doenças semelhantes às dos que morriam na travessia oceânica.  É certo que em processos desta natureza indivíduos tidos como "cativos indesejáveis" poderiam ser  mortos por seus captores, mas o argumento humanitário definitivamente não se sustenta8.  Nem o mais delirante ficcionista imaginaria negreiros enchendo seus navios com cativos sem valor de revenda.      

5- As potências ocidentais trabalharam incessantemente, contra os interesses das elites tradicionais das regiões que ocupavam, no sentido de eliminar a escravidão do continente africano.

      Muitos exemplos podem ser invocados para desfazer esta fábula reabilitadora do colonialismo.  Uma passagem de Paul Lovejoy é particularmente instrutiva:

As leis abolindo a escravidão nas colônias britânicas não eram aplicáveis ao Protetorado de Serra Leoa, onde a escravidão continuava a prosperar.  O escravismo desenvolveu-se, dessa forma, até muito tarde.  Os negócios com escravos não foram abolidos antes de 1896, e a própria escravidão foi considerada ilegal somente em 1926.  Freetown, apesar do nome, era a capital de um dos últimos bastiões da escravidão9.

       Nas colônias portuguesas da África, apesar da abolição oficial da escravidão na década de 1870, foram implantados o que Cabaço define como "regimes laboristas especiais que incluíam o trabalho forçado".  O tráfico de escravos, embora proibido desde 1840, permaneceu ativo na costa de Moçambique "até a alvorada do século XX", sob a proteção de agentes do Estado colonial10.  Já no Estado Livre do Congo, a monarquia belga entregou, na década de 1890, concessões a empresas que promoviam o extrativismo com vasto emprego de mão de obra forçada.  Ainda em 1908, quando o regime colonial assumiu diretamente o controle daquela região, a escravidão permanecia como "instituição marginal"11. 
              

Referências:

1-Alberto da Costa e Silva.   A enxada e a lança: a África antes dos portugueses.  Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: Edusp, 1992, p. 113 a 115.
2- A enxada e a lança, p. 158 a 160.
3- Idem, p. 167 a 179.
4- Alberto da Costa e Silva.  A manilha e o libambo: a África e a escravidão, de 1500 a 1700.  Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002, p. 368.
5-João Carlos Rodrigues.  Pequena história da África Negra.  São Paulo: Globo; Brasília: Biblioteca Nacional, 1990, p. 36-37.
6- A manilha e o libambo, p. 369.
7- Pequena história da África Negra, p. 81, 125 e 126.
8- Paul Lovejoy.  A escravidão na África: uma história de suas transformações.  Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 112-113.
9- A escravidão na África, p. 366.
10- José Luís Cabaço.  Moçambique: identidade, colonialismo e libertação.  São Paulo: UNESP, 2009, p. 52.
11- A escravidão na África, p. 381.

9 comentários:

  1. Concordo que a história da África é bem mais vasta que o estereótipo colonial popularizado nos filmes de Tarzan. Mas a história da África faz parte da História Geral, e não da História do Brasil - por esse motivo, acho de todo incoerente que o ensino da história da África seja tornado obrigatório no Brasil. Não houve nenhuma correlação entre a história da colônia do Brasil e a história dos reinos africanos nos últimos quinhentos anos, e isso é compreensível: os africanos que aportaram aqui vinham na condição de escravos, ou seja, instrumentos e não agentes, devendo amoldar-se à nossa história, e não amoldar-nos à história deles. A história do Brasil é parte da história do Mundo Ocidental, ao qual pertencemos; foram as idéias gestadas na Europa, suas revoluções e instituições peculiares que se tornaram nossos referenciais e direcionaram o rumo de nossa história até os dias de hoje.

    Na verdade, eu penso que a obrigatoriedade do ensino da história africana nas escolas, não só é incoerente como contraproducente: o mais provável é que servirá para reforçar os estereótipos de primitivismo e vitimização a que você se referiu. Isso porque os poucos referenciais que temos da África são vestígios culturais deixados por escravos, e escravos geralmente são oriundos das camadas de menor nível sócio-cultural. Por esse motivo, hoje, louva-se os cultos afro-brasileiros, e muitos até pensam que na África de hoje ainda predominam as primitivas religiões animistas que deram origem a esses cultos, quando na realidade a África atual é predominantemente monoteísta, em sua maioria muçulmana. Quanto à escravidão, devíamos deixar de hipocrisia: foi puro comércio, tido como legítimo enquanto foi lucrativo para ambas as partes, e tornado ilegítimo quando se incompatibilizou com os novos sistemas econômicos.

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  2. Raramente você esteve tão equivocado, e sobretudo depois de se declarar monarquista por diversas vezes. A História do Império esteve intimamente ligada à africana. Vejamos:
    .Tão logo chegou ao outro lado do Atlântico a notícia da independência do Brasil, começaram a circular panfletos pregando a adesão ao novo país, especialmente em Benguela, uma das principais bases do tráfico negreiro. Compreensivelmente, uma das condições colocadas por Portugal para reconhecer o governo de Pedro I foi a renúncia brasileira à união com qualquer outra possessão portuguesa.
    .É fato notório que ocorreram gestões para que o antigo reino do Daomé se tornasse protetorado brasileiro, e mais ainda que em várias partes da África Ocidental se formaram colônias de ex-escravos "brasileiros", com forte intercâmbio cultural entre as duas margens do oceano.
    .Muitas rebeliões escravas ocorridas na província da Bahia tiveram sua dinâmica (adesões, projetos) diretamente ligada às diferentes identidades étnicas africanas (em um determinado levante encontraremos "nagôs", em outro haussás, etc). As autoridades da época, ao contrário do que você pode imaginar, estavam sempre atentas a estas diferenças. Não lidavam com "escravos genéricos" idealizados.
    .Muito antes do Império, Palmares já era uma Angola Janga (Pequena Angola). Não se pode entender um dos maiores desafios lançados ao sistema colonial sem conhecer as culturas bantas da África Centro-Ocidental.

    A noção do escravo como mero instrumento chega a ser pueril. Basta lermos um pouco sobre um movimento como a Revolta dos Malês, onde se acham esboços de um programa de governo formulados por escrito.

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    1. Outro absurdo é acreditar que o estudo escolar da História da África é feito a partir de "vestígios dos escravos", quando ele se baseia nas obras de referência de especialistas que realizaram suas pesquisas ... na África, ou pelo menos dispuseram em larga margem dos arquivos dos antigos impérios coloniais. Tendo alguns minutos de disponibilidade, não seria má ideia você percorrer, por exemplo, o programa da pós-graduação em História da África da UCAM. (Não presto serviços por lá, antes que alguém invista no enredo)
      Quanto aos cultos afro-brasileiros, eu diria que eles ainda são muito mais incompreendidos e discriminados do que louvados. Aliás, é bastante contraditório alegar um quase exclusivismo ocidental em nossa formação social e reconhecer poucas linhas abaixo que a religiosidade popular possui fortes componentes de origem africana.
      Quanto à premissa de que a escravidão foi "puro comércio", devo lembrar que isto pode ser um excelente argumento contra o que alguns chamam de ampla liberdade econômica. A resultante dos interesses individuais, em muitos casos, pode ser um desastre para milhões.

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  3. A ideia de que a história da África não fez parte da história do "Brasil Colonial" (a denominação América Portuguesa é mais apropriada) é falsa. Um dos maiores historiadores brasileiros da atualidade, Luiz Felipe de Alencastro, afirma que a escravidão foi o lastro que permitiu a Portugal controlar sua sua colônia americana, pois essa forma brutal de trabalho era o que permitia a reprodução econômica da América Portuguesa.
    Resulta daí uma demanda de escravos, e entender como o escravismo se configurou na América Portuguesa requer conhecer a dinâmica das sociedades existentes na África, já que "o contingente principal da mão de obra nasce e cresce fora do território colonial e nacional".
    A necessidade de estudar a História da África também se justifica quando se estuda a escravidão tendo o escravo africano como agente da História, algo felizmente em voga na historiografia. Assim, estuda-se não somente a tráfico negreiro, mas a Diáspora Africana.
    Saindo do campo da escravidão, o historiador Maciel Santos demonstra que as flutuações econômicas na Amazônia brasileira afetava a produção de alguns locais da África, como Angola, por exemplo. Assim, a correlação entre a história do Brasil e a da África.
    Só podemos falar da ausência de correlação entre a história do Brasil e a da África caso queiramos falsear a História.

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    1. Ilustrando brevemente as suas observações, podemos lembrar que quando os holandeses tomaram as posições portugueses em Angola para abastecer Pernambuco, em 1640, a expedição de "reconquista", alguns anos mais tarde, partiu do Rio de Janeiro e foi financiada pela empresa traficante existente nessa última cidade.

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    2. Bem, isso não quer dizer muita coisa, pois em 1640 tanto portugueses quanto holandeses eram escravagistas.

      Pode-se falar do impacto que o comércio de escravos teve sobre a evolução histórica da África - basicamente a necessidade de atender à demanda induziu muitas guerras, alguns povos foram derrotados e reduzidos à condição de escravos, enquanto outros enriqueciam com o comércio e deram origem a oligarquias ainda hoje proeminentes na África. Mas isso foi o produto do comércio de escravos como um todo, e não especificamente com a América Portuguesa. Penso que pode-se falar de uma correlação da história da África com a história de Portugal entre os séculos 16 e 19, pois houve de fato uma interação e intervenção direta de Portugal na África durante esse período, mas a colônia do Brasil teve aí um papel totalmente passivo, de mero receptor de escravos. Esses escravos vieram a protagonizar episódios em nossa história que até merecem ser lembrados, mas já na condição de brasileiros, não de africanos - penso que eles não devem ser chamados de africanos apenas porque eram pretos.

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    3. O que se discute não é o "caráter escravagista" de portugueses ou holandeses, quando na verdade toda e qualquer colonização baseada na plantation no século XVII dependeria do braço escravo, e sim a vinculação entre as Histórias da África e a do História do Brasil.
      Voltemos ao meu exemplo, que de forma alguma você desconstruiu: os holandeses tomaram Luanda em 1640; oito anos depois, o governador do Rio, Salvador Corrêa de Sá e Benevides, grande traficante agindo também no interesse dos senhores de engenho da colônia, arma uma expedição, que conta inclusive com índios brasileiros entre seus soldados, e retoma aquela posição; Portugal, em plena guerra de "restauração" contra a Espanha, pouco ou nada poderia fazer por aqueles súditos do Atlântico Sul. Onde fica a tese da "passividade"?

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    4. Ainda sobre a "passividade": já ouviu falar em homens como Brás Carneiro Leão, Amaro Velho da Silva, Elias Antônio Lopes e Antônio Gomes Barroso? A partir de onde eles articulavam o abastecimento de escravos da América Portuguesa?
      Quanto ao argumento sobre os "pretos da África" que se tornavam brasileiros, vale relembrar a terminologia do período imperial: mesmo que corressem décadas desde a sua alforria, todos os documentos oficiais, além da imprensa, denominavam estas pessoas como "africanos livres". Caso conheça alguma exceção, apresente-a para a apreciação dos leitores.

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  4. Respondendo ao Pedro Mundim: A América Portuguesa não foi "passiva" em relação ao tráfico de escravos por dois motivos: em primeiro lugar, havia grupos residentes na colônia americana dos lusos que tinham interesses próprios, que, aliás, divergiam dos interesses metropolitanos. Foi por esse motivo que Portugal, por exemplo, estabeleceu que a América Portuguesa deveria estabelecer transações comerciais somente com ele, pois era necessário transformar a "exploração colonial' em "domínio colonial" (Alencastro, Luiz Felipe. O Trato dos viventes). Ora, tais grupos sociais também demandavam escravos. Esse argumento é bem ilustrado pela Revolta do Beckmão, no norte da América Portuguesa.
    Nesse sentido, também deve ser observado que o controle da colônia americana pela metrópole portuguesa se deu através do controle do fornecimento de escravos. Pensemos por um momento: entre todas as colônias das Américas, a de Portugal foi a que mais recebeu escravos. Será que isso foi devido à sua "passividade"? Sem dúvida alguma, sua tese é reconfortante ideologicamente, mas falseadora da realidade.
    No século XIX, basicamente entre 1801 a 1856, o número de escravos africanos aqui desembarcados foi superior ao montante dos três séculos anteriores. Passividade? Os africanos não vieram para cá por vontade própria.

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