sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Sobre a importância de reeleger Dilma Rousseff



     
       Após o estouro da "onda Marina", poucas semanas antes do desafio das urnas, a candidatura de Aécio Neves, que até então patinava nas pesquisas eleitorais com índices em torno de 20%, ou mesmo abaixo, cresceu com rapidez.  Os 33,55% dos votos válidos alcançados por Aécio em 5 de outubro de 2014 representaram surpresa para muitos dos eleitores tucanos do tipo mais otimista. É certo que as imprecisões do discurso da candidata do PSB, a relativa fragilidade de suas bases políticas e seu despreparo para a batalha retórica que caracteriza todas as disputas para a Presidência da República contribuíram para aquela reviravolta.
      Entretanto, só podemos explicar a velocidade com que se deu o processo a partir da constatação de que, tendo no horizonte o inevitável naufrágio de Marina e a chance real de uma vitória de Dilma Rousseff já no primeiro turno, o poder econômico e as instituições de viés conservador, em sua quase totalidade, se articularam com eficiência no propósito de concentrar votos em Aécio.  Esta movimentação, algo discreta, não apenas levou o ex-governador de Minas Gerais ao segundo turno, com uma larga vantagem sobre a terceira colocada, como ainda logrou o sucesso, inédito desde pelo menos a eleição de Fernando Collor, de unificar a direita.
  Salvo raríssima exceção, liberais, anarcocapitalistas, liberais conservadores, conservadores autoritários, separatistas, monarquistas e fascistas declarados, com o reforço de um punhado de socialdemocratas verdadeiros, hoje cerram fileiras com o PSDB.  Seria ingenuidade ver nesta aglutinação apenas o objetivo comum de remover Dilma do Planalto, ou mesmo de interromper o "ciclo de governo" petista, expressão já utilizada em algumas edições do horário eleitoral. Organizada, sem dúvida, por forças cujo alcance se estende a todo o território nacional, a ascensão de Aécio obrigatoriamente se vinculou a um bom número de compromissos programáticos, procurando contemplar interesses variados e hierarquizados conforme o peso econômico e político de cada setor.
        Apesar do entusiasmo demonstrado por uma parte da extrema direita com as modificações ocorridas no Congresso, o fato é que tanto Dilma quanto Aécio conseguiriam, com facilidade, formar uma maioria parlamentar.  Não obstante os triunfos de reacionários boquirrotos como Jair Bolsonaro e Marco Feliciano, houve um significativo esvaziamento das legendas mais identificadas com a herança da ditadura civil-militar, o PP e o DEM, contradizendo os delírios dos saudosistas da era dos presidentes-generais, sempre prontos a se declararem porta-vozes de uma certa maioria silenciosa, de existência bastante discutível.
         Parece acontecer, no momento em que escrevo estas linhas, uma debandada parcial do eleitorado de Aécio, determinando, para o próximo domingo, tendência favorável à reeleição de Dilma.  Não é hora, entretanto, de euforia para a esquerda, mas sim de redobrar esforços para assegurar uma ampla vitória; ao inverso do que Aécio alega na televisão, o inimigo não é ele, mero playboy de meia idade, político profissional (no pior sentido do termo), senador sem causas, que deve a carreira, em sua maior parte, a um fenômeno bastante disseminado em nosso país: o nepotismo/filhotismo; é o conjunto das forças que se somaram ao PSDB.  
         Valendo-se do inevitável desgaste que se impõe ao PT pela circunstância de ocupar há doze anos a Presidência, a direita está preparada, em caso de vitória, para executar um vasto programa definido por retrocessos na área social. Um eventual governo Aécio não seria simples reedição dos anos FHC, mas uma reformulação daquelas políticas com o acréscimo de vários pontos da agenda de grupos de pressão ultraconservadores; em tal conjuntura, poderíamos esperar, além da compressão da massa salarial, pesados ataques aos movimentos sociais e ao sindicalismo, sustentados por um discurso oficial hipócrita repleto de chavões como "austeridade", "ordem" e "defesa da família".     
          Sob a perspectiva oposta, porém, a esperada reeleição, se confirmada no final de semana, deve causar enormes prejuízos à direita.  Caso seja batido pela quarta vez consecutiva, o PSDB verá a descrença em seu projeto de poder atingir até a militância mais entusiasmada.  Recém-derrotado, mesmo com tantos recursos à sua disposição, Aécio dificilmente obterá uma segunda chance em 2018, diante do tucanato paulista.  Este, por sua vez, tem contra si altos índices de rejeição na maioria dos estados. Atentemos para a quase ausência de FHC na campanha ora em curso,  enquanto Lula, mesmo aparentando saúde frágil, esteve com assiduidade ao lado de Dilma. Poucas coisas agradariam mais à esquerda brasileira do que ter como oponentes, daqui a quatro anos, as desgastadas figuras que atendem pelas alcunhas de Picolé de Chuchu e Zé Pedágio.  Restaria à direita, talvez, trabalhar desde já na construção de um novo Collor, ou de um novo Jânio.  
        Manter o PSDB fora do Planalto, contudo, não seria o principal benefício da vitória de Dilma. Negando nas urnas um mandato a Aécio, o eleitor brasileiro deixa uma mensagem nítida: a de que repele o status quo, as relações de exploração e dominação historicamente construídas; ao contrário, mais uma vez, do que pretendem os arautos do mito do "povo pacífico e ordeiro", sempre pronto a dar assentimento e celebrar a liderança dos seus algozes.  O  cidadão comum sabe que Aécio Neves tem sido ao longo de 2014 o candidato preferido dos banqueiros, dos industriais, dos latifundiários, dos magnatas do comércio varejista, dos donos das empresas de ônibus, das faculdades particulares e dos órgãos da grande imprensa; dos clubes, sociedades e federações em que se reúnem os representantes destes segmentos.  O voto em Dilma, se não for a própria negação do princípio da "necessidade de aristocracia", é, em hipótese mais modesta, um atestado do desprezo do brasileiro médio pelos aristocratas que temos, progressivamente incapazes até de vender ilusões.                         
      
                                        


          

2 comentários:

  1. Quem es tu Gustavo Moreira? O Brasil realmente está perdido. Um néscio ministrando aulas de forma parcial, que expõe um ponto de vista lulista nas salas, representa, de forma degradante e rápida, a destruição do nosso ensino público.
    Saudações monarquistas.
    Viva Dom Bertrand!

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    1. Tudo realmente está perdido para alguém que supostamente lê, ou pelo menos junta as letras, de um texto sobre política partidária, e a partir daí determina o que faço ou deixo de fazer em salas de aula. Porém, nestes dias tão auspiciosos, devo retribuir os votos com saudações lulistas!

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