sábado, 26 de maio de 2012

A direita "respeitável" e seu embaraçoso parentesco com o fascismo (IV)- Alemanha

Hitler com o político conservador Von Papen 
         

       Constatamos pelos textos de Stackelberg que o nazismo, desde os primórdios, esteve no campo conservador, apesar das táticas políticas pouco convencionais adotadas por sua militância.  Hoje, veremos que este alinhamento foi fundamental para a chegada de Adolf Hitler ao poder. Tal como os fascistas na década anterior, os nazistas, no início dos anos 30, buscaram adesão entre uma das parcelas mais conservadoras do eleitorado germânico: os proprietários rurais, cujos votos se concentravam, em sua maioria, nos nacionalistas de direita.    


           Mesmo que esta aliança tenha sido circunstancial, contribuiu bastante para que o partido nazi, antes débil nas urnas, se transformasse na maior força eleitoral da Alemanha¹.    


         Também como Mussolini, Hitler tratou, em sua marcha rumo ao governo, de enfraquecer as eventuais restrições que sofria da parte dos industriais.  Para isto, adotou um discurso mais nitidamente pró-capitalismo, além de se apresentar como um defensor da ordem².  


      Em julho de 1932, os nazistas obtiveram seu melhor resultado eleitoral durante a vigência do pluripartidarismo: 37,4% dos votos nacionais³.  É preciso atestarmos, portanto, a inconsistência de uma falácia bastante difundida pelos reacionários, a de que o "povo alemão", visto como uma horda de  bárbaros manipulados por uma espécie de louco talentoso, se atirou de maneira quase unânime nos braços dos nazistas.  Este mito serve, naturalmente, aos que pretendem deslegitimar ou minimizar a importância do voto popular.       


       Também previsivelmente, o crescimento dos nazistas se deu às custas da direita tradicional, desgastada pela péssima situação econômica do país.  É particularmente difícil acreditar que os votantes "da classe alta e da classe média superior", identificados por Stackelberg como um dos pilares da base de apoio do nazismo, tivessem em algum momento simpatias pelo comunismo.  Aliás, aqui fica descontruída uma outra fábula, a de que Hitler competia com os comunistas pelo mesmo tipo de eleitor.  Os trabalhadores aderentes ao nazismo estavam, em regra, fora dos sindicatos e das organizações políticas de esquerda.


       Após o fatídico pleito, os conservadores alemães perceberam que a antiga atitude de dirigir pelo alto, ignorando a crescente participação das massas na política, nunca mais funcionaria4.  Desta forma, ruíram suas últimas resistências a uma iminente administração nazista.    


       No início de 1933, Hitler chegou ao governo, por vias "legais", sem dúvida, mas com significativos impedimentos, decorrentes do fato de não possuir maioria absoluta no Parlamento.  Nesta altura, a minoria anticapitalista já fora removida do seu partido, o que tranquilizava o empresariado5.    


         Presos arbitrariamente os deputados comunistas, as demais forças parlamentares de direita deram ao Führer o que ele mais precisava: aprovada a Lei Capacitadora, Hitler poderia governar por decreto durante quatro anos, sem prestar contas ao Legislativo ou ao presidente.  Além dos nacionalistas órfãos do Império Alemão, os nazistas dispuseram do apoio da Igreja conservadora na votação de 24 de março de 1933 [6].        


        Coerentemente, Hitler, no mês anterior, proferira discurso de tom fortemente emocional no sentido de  congregar suas bases direitistas.  Notemos, além do chamado anticomunista, a negação das divisões e disputas entre classes7, postura muito cara a conservadores, liberais ... e fascistas.  


     Retornaremos ao tema em futuras postagens, que deixarão cada vez mais claro que as aproximações da direita "respeitável" com a direita selvagem e genocida não foram um mero acidente de percurso, restrito às primeiras décadas do século XX.  

Notas:
1-Robert O. Paxton.  A anatomia do fascismo.  São Paulo: Paz e Terra, 2007, pp. 115/116.
2- Idem, p. 175.
3- Roderick Stackelberg.  A Alemanha de Hitler: origens, interpretações, legados.  Rio de Janeiro: Imago, 2002, p. 137.
4- Idem, p. 138.
5- Ibidem, p. 140.
6- Paxton, p. 181.
7- Stackelberg, p. 144.





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