terça-feira, 14 de agosto de 2012

A face do retrocesso: direitistas na Câmara dos Deputados

         
                




         A matéria de hoje bem poderia receber o título de Outros dez motivos para não votar na direita, e dispensa uma introdução excessivamente longa.  Recorrendo aos Anais da Câmara dos Deputados, selecionei, entre incontáveis possibilidades, um conjunto de falas de políticos de vários partidos, que transcrevo com os devidos créditos autorais.  Percebemos, ao longo de três décadas, a continuidade de um discurso que associava a boa convivência social ao conservadorismo, a democracia ao capitalismo e a segurança do país a um alinhamento incondicional com os interesses geopolíticos dos Estados Unidos.  Longe de ter desaparecido, como se queixam os "vitimistas" de direita, esta visão sobrevive, com as necessárias adaptações conjunturais, e merece, mais do que nunca, ser combatida pelas forças populares.            

23 de agosto de 1961
Último de Carvalho (PSD-MG) alerta contra a bolchevização do Brasil promovida por ... Jânio Quadros!

Hoje, a nossa área política é a que combate o governo do Sr. Jânio Quadros no exterior e no interior porque não é possível distinguir-se o Presidente da República em duas áreas de atuação diversas, quando o mundo está colocado em dois grupos ideológicos, Ocidente ou Oriente.  O Sr. Carlos Lacerda, espírito que reconheço devotado à democracia, não poderia continuar naquele barco vermelho em que navega o Presidente da República: rumo ao Oriente.  


12 de maio de 1964
Francelino Pereira (UDN- MG) recrimina Juscelino Kubitschek por se apresentar como candidato à Presidência sem firmar compromisso com o programa golpista em vigor:

Os mineiros- e, também com eles, os brasileiros- estão a lamentar a ausência de um gesto à altura do momento por parte do seu não menos ilustre coestaduano, o ex-presidente Juscelino Kubitschek: Sua Exa. prossegue em sua faina de ser candidato sem que defina antes objetivos da revolução vitoriosa e das forças vencidas e vencedoras.  Como se sabe, a revolução veio alterar profundamente as perspectivas do quadro sucessório brasileiro.  As candidaturas anteriormente anunciadas por iniciativa dos próprios candidatos, refletindo ou não inspirações partidárias, já não podem ser consideradas sob os mesmos interesses e sob as mesmas inspirações.  Após a revolução, as circunstâncias estão a exigir novo comportamento das lideranças políticas.  Impatriótico e temerário será qualquer candidato, em suposto nome desta ou daquela agremiação partidária, e, sobretudo de suas próprias ambições, pretender impor o seu nome à sucessão presidencial, sem definição e a qualquer preço.  Fez-se uma revolução e ela é que legitimou, em nome da nação brasileira, os atuais mandatos legislativos.  Não se há, pois, de compreender que não haja daqui por diante correção nos métodos e processos de escolha de candidatos.  Não se há de compreender que se prossiga ao mesmo estilo político, uns na linha dos objetivos da revolução, outros ainda silenciosos, mas desejosos- todos o sabemos- de disputar o próximo pleito com bandeiras opostas a esta mesma revolução, quando é certo que contra ela não se pronunciaram para não se pronunciarem a seu favor.



21 de março de 1975
Jorge Arbage (ARENA-PA), endossa e lê no plenário artigo de jurista que criava uma perspectiva apocalíptica em torno da possível aprovação de uma lei do divórcio:

Implante-se o divórcio, no Brasil, e seus frutos serão amargos.  Não se trata de espírito conservador, inadequado ao tempo, mas sim a resistência a um presumido bem, que só mal nos trará.  Fazer um segundo casamento legal, ou terceiro e um quarto, numa sociedade ainda em formação como a nossa, implicaria em dissolver a família, em liquidar o patrimônio que protege e ampara o casal e seus filhos e todos nós seríamos arrastados a esse abismo legalizado.  Triste a condição do homem que altera a boa estrutura que ele mesmo criou, para trocá-la por outra com base na anarquia social.  O povo despreparado e crédulo não tem condições para decidir sobre assunto de tal natureza.   


1º de abril de 1975
Luiz Rocha (ARENA-MA) apresenta a ditadura como salvadora da vida parlamentar no país:

O orador que nos antecedeu verberou contra a não participação do jovem na vida pública. Ao contrário, desejamos dizer que a nossa presença nesta tribuna é uma afirmação de que a juventude tem tido oportunidades, o que não ocorria antes de 1964. Não fora a Revolução de 1964, não teríamos assegurada a nossa voz, a nossa presença nesta Casa do Parlamento.

25 de abril de 1984
Siqueira Campos (PDS- GO) define o voto por eleições diretas como golpe contra as instituições democráticas:

Sr. Presidente, Srs. Deputados, a hora é de definição, de marcar posição em favor ou contra a liberdade, a democracia. É hora de definir responsabilidades: quem for democrata que lute e vote pela manutenção dos critérios instituídos pelas urnas livres de 15 de novembro de 1982; quem for pelo golpe, quem for contra a estabilidade das instituições democráticas, quem for contra o povo, que vote pela aprovação da chamada Emenda Dante de Oliveira.


27 de abril de 1984
Assis Canuto (PDS- RO) louva o seu partido por ter bloqueado a aprovação das eleições diretas para presidente:
A coragem e a convicção dos Deputados do PDS, em rejeitar a Emenda Constitucional n. 5, que restabelecia eleições diretas para Presidente da República, e o comportamento ordeiro do povo brasileiro são fatos relevantes que o Governo deve levar na devida conta.  Na realidade, os políticos e o povo deram uma demonstração de que sabem o que querem, e ao Governo não será lícito desconhecer estas razões. Mais do que a derrota da Emenda, mais importante foi a maneira com que todos os segmentos da sociedade absorveram os resultados, oferecendo àqueles (tanto radicais de direita como de esquerda) que esperavam reações turbulentas para atingirem objetivos escusos e inconfessáveis, uma lição cívica de doer o coração. Acabrunhados e frustrados, retornaram à faina de seus afazeres diários, resignados, mas não derrotados, e aguardam uma resposta satisfatória do Governo. A Nação clama pelas reformas tão necessárias a recondução do País à trilha da normalidade política, e ao PDS está reservado um papel de ser o grande veículo partidário para esta retomada de rumos.


15 de março de 1988
Antônio Ueno (PFL- PR) tenta convencer a Constituinte que a demarcação das terras indígenas poderia inviabilizar o capitalismo:

Não há dúvida de que a Constituição que estamos elaborando e que dentro de mais alguns dias será promulgada deve prever a proteção de terras indígenas, de modo a preservar os costumes, a cultura e a forma de vida dos silvícolas. Entretanto, entendemos que da forma emocional como vem sendo tratado o problema, desde o início dos trabalhos, corremos o risco de abolir a iniciativa privada de nosso País. Sabemos que todo o território nacional esteve por algum tempo na posse do índio. Isso não significa que, em consequência, tenhamos que desenvolvê-lo agora.



14 de junho de 1988
Nilson Gibson (PMDB-PE) propõe uma articulação militar pró-EUA diante da presença comunista na África:

Devemos reconhecer que a costa africana representa, hoje, em certas áreas, uma ameaça ao desequilíbrio da segurança continental e, por isso mesmo, à própria soberania nacional. Angola já está dominada por um regime comunista, como satélite de Moscou, enquanto várias outras nações africanas também se deixaram empolgar pela pregação bolchevista, não ameaçando apenas o chamado Terceiro Mundo, mas podendo transformar-se em bases de uma possível agressão vermelha contra a segurança dos países ocidentais. Nesse contexto de estratégia mundial cresce de importância o papel desempenhado pela Marinha de Guerra do Brasil, como fator de tranquilização no que tange à segurança do Cone Sul, contando decerto, com o apoio da Argentina, do Uruguai e também dos Estados Unidos.

10 de novembro de 1989
João de Deus Antunes (PTB-RS) recorre ao anticomunismo primário contra a candidatura de Lula e tenta apresentar como traidores os religiosos aliados à esquerda: 

Estamos vendo, também, o Sr. Luiz Inácio Lula da Silva recebendo adesão de grupos pseudo-evangélicos, o Movimento Pró-Lula, enquanto seu partido faz coligação com o PC do B, ·muito mais violento que o PCB do Sr. Roberto Freire. É o mesmo "Partido dos Trabalhadores" que votou contra a inclusão da expressão "sob a proteção de Deus" no preâmbulo da Carta Constitucional e que se apresenta hoje como "salvador da pátria", quando, na verdade, quer nos tomar escravos de um regime que nada acrescenta de bom, pelo contrário, cerceia todas as liberdades.  


15 de março de 1990
Paes Landim (PFL-PI) transforma um dos sustentáculos da ditadura em baluarte da democracia:

Os que combatem hoje as Organizações Globo nesse processo, aliás, esquecem que a rede foi a grande responsável pelo processo de abertura política do País, em 1985, promovendo a campanha "Diretas já", impulsionando a candidatura de Tancredo Neves, ajudando sua legitimação perante a opinião pública nacional. Foi este um grande papel que a Globo prestou à democracia brasileira, hoje esquecido dos que se beneficiaram deste processo de abertura, que teve nela um grande indutor.





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