sexta-feira, 12 de abril de 2013

A direita e o social: contradições estruturais e discurso vazio

       

      A despeito das inegáveis vitórias políticas obtidas pela direita nas décadas de 1980 e 1990, poucas vezes vemos liberais e conservadores discursando em prol das bandeiras que fazem deles direitistas: essencialmente, a preservação das desigualdades econômicas e sociais através da manutenção, por todos os meios ao seu alcance, das hierarquias informais, porém enraizadas nas sociedades, de classe, gênero e etnia.  É certo que podemos encontrar tal defesa em sites de extremistas que flertam ou aderem sem disfarces ao neonazismo, mas praticamente nunca na fala de políticos com pretensões eleitorais sérias ou de formadores de opinião desejosos de conservar respeitabilidade diante de um público mais amplo.
      Não faltará, sem dúvida, um interlocutor que venha a me explicar o fenômeno se reportando à suposta "erosão dos valores tradicionais".  Todavia, é interessante verificarmos que esta tendência evasiva nada tem de ineditismo. Podemos encontrá-la, por exemplo, na documentação de um período no qual a direita também detinha uma posição ofensiva: os primeiros anos da ditadura civil-militar inaugurada em 1964.  As mensagens oficiais dos generais-presidentes, não obstante as muitas críticas diretas e indiretas ao governo de João Goulart, contêm diversas passagens que o dirigente deposto talvez subscrevesse com orgulho. Nelas, o regime reivindica ideais igualitários que contrastam brutalmente com a ação cotidiana do Estado sob seu controle.                 
           Logo na primeira mensagem presidencial publicada na ditadura, a de 1965, Humberto de Alencar Castelo Branco (1897-1967) elabora uma condenação dos privilégios vigentes que pouquíssimos esquerdistas deixariam de endossar.  Fica óbvio que o ilustre "revolucionário" enxergava com bastante clareza o quão discriminatória era a sociedade brasileira.   

          No ano seguinte, Castelo Branco, apesar de ter chegado ao poder em parte nada desprezível com o apoio dos que temiam as reformas de base de João Goulart, se declara um partidário da redistribuição das terras aráveis, admitindo direitos de setores historicamente alijados da propriedade rural.   



http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u1347/000104.html

         Na mensagem de 1967, última de sua administração, Castelo Branco aponta para a necessidade de melhoria das condições de vida das classes trabalhadoras.  Para asco dos entusiastas do Estado-mínimo, notemos que o presidente da República, pelo menos no terreno retórico, considera essencial a ação do governo no sentido de reduzir variadas "carências" da população.    



http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u1334/000093.html
           Confesso alguma surpresa ao achar, na mensagem de 1968, o linha-dura Arthur da Costa e Silva (1899-1969) afetando preocupação com o poder de compra dos salários de seus governados. Ele chega à temeridade de admitir que a política econômica em vigor nos anos anteriores tinha resultado em compressão salarial.

 



               Já o general Emílio Garrastazu Médici (1905-1985), na mensagem de 1970, reconhece o dever do Estado de estender a assistência médico-odontológica aos estudantes do antigo Primeiro Grau, listando também incentivos econômicos convenientes aos alunos pobres de todos os níveis.   

 
           Nem o mais fanático partidário de 1964 acreditaria na real intenção da ditadura de remover as barreiras sociais impostas aos pobres e aos negros, facilitar o acesso universal de posseiros e meeiros à propriedade de terras e instruir os filhos dos trabalhadores braçais se pautando em padrões de excelência.  Seria como crer em um César Maia, no mais recente programa do DEM, pregando a remodelação do Estado na direção do interesse público.  Avançando ou recuando, a direita jamais pode mostrar sua verdadeira face, por mais que reclamem os puristas do elitismo; pelo menos enquanto existirem o sufrágio universal e a democracia de massas.      

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