segunda-feira, 30 de abril de 2012

Trinta pérolas do reacionarismo brasileiro


                                               (Miguel Reale em seus tempos de integralista)

     No dia 9 de abril, reuni rapidamente algumas anotações guardadas no Orkut para produzir os "Trinta estímulos para nunca votar na direita".  Pelo pouco esforço e pela falta de maiores pretensões, pensei que seria uma postagem simples, lida talvez por trinta ou quarenta pessoas.  Surpresa: o texto teve centenas de acessos e foi copiado em diversos sites e comunidades virtuais.  Coletei, então, mais dados para uma espécie de reprise, prestigiando somente com reacionários tupiniquins.  Não me acusem, por favor, de patriotada.  O objetivo é apenas reforçar o que já disse há três semanas: nunca, nunca mesmo, votem na direita!
     Registro meu agradecimento aos colunistas do Mídia sem Máscara pelo fornecimento involuntário, mas gratuito, de matéria-prima.

1-José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838): um dos fundadores do Estado brasileiro (azar o nosso) formula suas propostas de “integração social”:

“Seria útil admitir que os pais dos índios bravos que quiserem reconhecer o domínio português possam sujeitar os filhos a uma espécie de domesticidade ou escravidão temporária que não deve exceder cinco anos: tempo suficiente para educar os filhos a uma vida mais laboriosa, e indenizar-se o patrão do preço, porque o houve”.

(SILVA, José Bonifácio de Andrada e. Projetos para o Brasil/organização Miriam Dolhnikoff. São Paulo: Companhia das Letras; Publifolha, 2000, p. 68)

2-Manuel Caetano Almeida de Albuquerque, constituinte de 1823, define quem pode ou não ser cidadão, na visão dos plantadores escravistas:

“Pretender que sejam cidadãos brasileiros todos os membros da sociedade, é querer confundir as ideias: seria bom que todos fossem cidadãos, mas não é isto uma verdadeira quimera?  Em um país, onde há escravos, onde uma multidão de negros arrancados da costa d’África, e d’outros lugares, e forma parte das famílias, como é possível que haja essa divisão? [...] Como seremos nós os que desapreciaremos o título de cidadão brasileiro, dando-o imediatamente a todo o indivíduo?”

(citado em SLEMIAN, Andréa.  Impasses na construção da cidadania.  In: Independência: história e historiografia/org. István Jancsó.  São Paulo: Hucitec; Fapesp, 2005, p. 839)     

3-João Maurício Wanderley (1815-1889), barão de Cotegipe, protesta contra o tímido abolicionismo gradual da década de 1860:

“O que se vê hoje é uma propaganda da abolição a se estender por toda parte.  Avançando o Governo imperial nessa ideia, não já há mais pena capital contra escravos que se execute.  Todos os assassinatos por eles cometidos são seguidos agora do perdão do Poder Moderador... Não será isso um plano para quebrar antes do tempo os laços de obediência que prendem o escravo ao seu senhor?”.

(citado em GERSON, Brasil.  A escravidão no Império.  Rio de Janeiro: Pallas, 1975, p. 125)

4-João Manuel Pereira da Silva (1817-1898)- Um ex-dirigente do Partido Conservador do Império e ex-conselheiro de Pedro II enaltece, em seu livro de memórias, a índole dos senhores de escravos e o valor dos cativos que respeitavam as regras da escravidão:

“Não se encarecem bastante as qualidades humanitárias do coração brasileiro.  Pequenas exceções não lhes devem embotar o brilho.  As numerosas alforrias espontâneas, realizadas desde 1871, provavam não somente a generosidade de suas almas, como os desejos de tornar os escravos morigerados, trabalhadores, e agradecidos, concedendo-lhes a liberdade, e estabelecendo-os como exemplo e prêmio para os que restavam no cativeiro e que procedessem regularmente. 

(PEREIRA DA SILVA, João Manuel. Memórias do meu tempo.  Brasília: Senado Federal, 2003, pp. 557/558)

5-Abílio César Borges (1824-1891), barão de Macaúbas, temia (em 1856) que o aumento da escolaridade dos pobres resultasse em subversão:

“Distribuída com muita profusão e pouco discernimento, a educação secundária inspira aos mancebos das classes inferiores o desprezo de seus iguais e o desgosto de seu estado, granjeando-lhes uma espécie de enganadora superioridade que mais não lhes permite contentarem-se com uma existência obscura, e que entretanto não lhes dá essa superioridade real que poucos homens têm recebido da natureza, e que nenhuma educação poderia adquirir: e destarte ela povoa a sociedade de membros sem préstimos, que lhe levam o espírito de insubordinação, o desejo de mudanças e uma ambição inquieta e vaga a que não pode satisfazer uma situação sempre incerta e que se move em todos os sentidos para adquirir abastança ou autoridade”.

(citado em SAVIANI, Dermeval.  História das ideias pedagógicas no Brasil.  Campinas: Autores Associados, 2010, p. 153)  

6-Sílvio Romero (1851-1914), ensaísta sergipano, apresenta suas propostas para o povoamento do Brasil:

“Creio, com os mestres, Ammon, Livi, Woltmann, Lapouge, Niceforo, que os bons elementos ‘eugênicos’, preponderantemente arianos no Mundo Ocidental, vão sendo assustadoramente gastos pelo mestiçamento desastrado com elementos indestrutíveis que tendem a crescer.  Maior, evidentemente, é o perigo em terras, como as do Novo Mundo, povoadas pelos processos postos em prática, especialmente no Brasil.  Daí, a urgentíssima necessidade da colonização da forma indicada.  Daí, finalmente, a necessidade de seleção, que já vai sendo, seja dito de passagem, praticada em certos centros anglo-americanos, saxônicos e germânicos, contra a reprodução dos degenerados, loucos, epiléticos, tuberculosos, alcoólicos, morféticos”.

(ROMERO, Sílvio.  Realidades e ilusões no Brasil: Parlamentarismo e presidencialismo e outros ensaios.  Petrópolis: Vozes; Aracaju: Governo do Estado de Sergipe, 1979, p. 320) 

7-O Dr. Nina Rodrigues (1862-1906) defende uma maioridade penal “tardia” para os brasileiros com um argumento sui generis:

“Não há, portanto, maior contrassenso do que pedir, em nome das nossas raças inferiores e da inferioridade da nossa cultura mental, que nos códigos penais brasileiros se marque à menoridade um prazo maior do que o aceito para as raças europeias.  Os povos civilizados mais cultos, o inglês, o italiano, o alemão, por exemplo, cujas cerebrações devem ser de mais lento desenvolvimento, se contentam com sete, nove, doze anos; no Brasil, por causa de suas raças selvagens e bárbaras, o limite de quatorze anos ainda era pequeno!”

(RODRIGUES, Nina.  As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil.  Bahia: Imprensa Popular, 1894, pp. 134/135)   

8-Euclides da Cunha (1866-1909)- O célebre escritor e repórter rende seu tributo ao racismo científico:

“A mistura de raças mui diversas é, na maioria dos casos, prejudicial.  Ante as conclusões do evolucionismo, ainda quando reaja sobre o produto o influxo de uma raça superior, despontam vivíssimos estigmas da inferior.  A mestiçagem extremada é um retrocesso.  O indo-europeu, o negro e o brasílio-guarani ou o tapuia, exprimem estágios evolutivos que se fronteiam, e o cruzamento, sobre obliterar as qualidades preeminentes do primeiro, é um estimulante à revivescência dos atributos primitivos dos últimos.  De sorte que o mestiço- traço de união entre as raças, breve existência individual em que se comprimem esforços seculares- é, quase sempre, um desequilibrado”.

(CUNHA, Euclides da.  Os sertões.  São Paulo: Círculo do Livro, p. 91)

9-Cândido Mota, diretor do Instituto Disciplinar de São Paulo no início do século XX, associa criminalidade e hereditariedade e praticamente afirma que não há nada a fazer:

“A hereditariedade mostra que crime, loucura, alcoolismo, nervosismo são anéis de uma mesma cadeia.  Encontram-se [sic] quase sempre nos antecedentes hereditários dos menores viciosos ou criminosos uma tara que explica sua anomalia.  Esta influência da hereditariedade física ou moral pesa tanto mais acabrunhadoramente sobre o menor quanto mais ele vê em seus pais, como em um espelho, o reflexo de seus próprios vícios.  Assim, a influência modificadora da educação não pode, nestes casos, agir eficazmente sobre esta criança, contrariada, como é, pela influência nefasta dos pais e do meio”.

(citado em VIANNA, Adriana de Resende B.  O mal que se adivinha: polícia e menoridade no Rio de Janeiro, 1910-1920.  Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1999, pp. 146/147)

10-Oliveira Viana- O sociólogo elitista fantasia sobre a colonização paulista no Rio Grande do Sul:

“Pastores em grande escala, eles têm, socialmente, o sentido aristocrático do landlord,o orgulho da sua pureza genealógica, conjuntamente com o gosto da solidão e do isolamento”.

(citado em SODRÉ, Nelson Werneck.  A ideologia do colonialismo e seus reflexos no pensamento brasileiro.  Petrópolis: Vozes, 1984, p. 197)

11-Juarez Távora (1898-1975)- Um dos expoentes do Movimento Tenentista prega a tutela sobre o “populacho”:

“A História não cita, como regra, exemplos de revoluções vitoriosas, em que a força armada não tenha precedido o povo ou, pelo menos, com ele fraternizado, no momento das pugnas decisivas.  E essa interferência benéfica da força armada não se tem limitado apenas a permitir ao povo descartar-se de seus tiranos: tem valido, no meio de desordens generalizadas que caracterizam essas crises sociais, como um escudo protetor da nação contra os excessos da indisciplina popular.  A França de 89 e a Rússia de nossos dias pagaram tributos caríssimos de sangue à sede de vingança das massas oprimidas, enquanto o delírio da demagogia não se submeteu à influência moderadora do elemento militar.  E quem, entre nós, seria capaz de prever as últimas consequências da subversão social criada pelo predomínio incontrastável do populacho?  Será essa a revolução que admitem os nossos políticos?”

(citado em FAUSTO, Boris. A revolução de 1930.  São Paulo: Brasiliense, 1991, pp. 65/66)

12-Armando de Salles Oliveira (1887-1945)- Um dos líderes da oligarquia paulista, que pretendia concorrer à Presidência da República, escancara seus amores pelo nazifascismo (25/01/1936):

"Olhando para o que se passa nos grandes países, vemos que, para imprimir novo entusiasmo à mocidade, os nacionalismos de todos os matizes assenhoram-se da educação, dirigem-na e fazem dela uma irresistível força de disciplina e solidariedade. A Itália (...) dá caráter militar à severa educação de seus filhos. Na Alemanha, o Estado apodera-se da mocidade e impõe-lhe o culto da guerra".

(citado em BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita.  A UDN e o udenismo.  Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981, p. 246) 

13- Adolfo Morales de Los Rios Filho (1887-1973)- O cronista do Rio Imperial extrapola em seu etnocentrismo (edição original de 1946):

“Outra diferença fundamental existente entre os atos fetichistas realizados nas terras africanas e os levados a efeito no Brasil é que o culto genuíno dos negros aqui se transforma em culto híbrido: mistura de rito pagão, grosseiro e brutal, com certas cerimônias peculiares à religião católica”.

(LOS RIOS FILHO, Adolfo Morales.  O Rio de Janeiro imperial.  Rio de Janeiro: Topbooks, 1946, p. 501) 

14- Manoel Rodrigues Ferreira, jornalista e historiador, atribui as mazelas do país em pleno governo Dutra (o texto original é de 1950) à derrubada da monarquia:

“O povo brasileiro foi submetido ao mais violento impacto que podia ser produzido por uma revolução que subverteu nas suas bases um regime político, uma estrutura política sobre a qual repousava solidamente a unidade nacional.  Naqueles dias tumultuosos, se o Brasil não se subdividiu em republiquetas independentes, pode-se atribuir tal fato não a um milagre, mas sim à verdadeira vocação que tem para a unidade o povo brasileiro.  O que não obstou que a atitude anti-histórica dos republicanos fosse a responsável pelos males sofridos pelo país até os dias de hoje, durante mais de meio século, portanto”.

(FERREIRA, Manoel Rodrigues.  A evolução do sistema eleitoral brasileiro.  Brasília: Senado Federal, 2001, pp. 321/322)

15-A revista Anhembi, editada por simpatizantes da UDN, transparente em seu elitismo tosco, na edição de outubro de 1952:

“Está se conhecendo entre nós certa confusão no conceito de povo.  Talvez o povo não se constitua apenas do rebotalho que os demagogos cortejam com promessas utópicas.  É muito possível que não pertencendo ao populacho, os homens de colarinho e gravata sejam também povo.  Ou não o serão só porque sabem ler, pensar, divergir?  Será isto plutocracia?  Como poderia então um governo que faz praça de suas bases populares, prestigiar-se com o sonhado apoio de um partido (UDN) de eleitorado asseado, e com sua força moral tirar a nação do abismo em que se acha”.

(citado em BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita.  A UDN e o udenismo.  Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981, p. 271)   

16-Jornal das Moças, revista destinada ao público feminino, oferece uma perspectiva para suas leitoras (2 de abril de 1959):

“O marido perfeito está ao nosso alcance, se cuidarmos de seu bom humor e não considerarmos nunca como uma obrigação- ou como uma coisa natural- sua eventual colaboração nos trabalhos domésticos.  O trabalho caseiro é nosso, o marido tem o seu”.

(citado em BASSANEZI, Carla.  Mulheres dos anos dourados.  In: História das mulheres no Brasil.  São Paulo: Contexto, 2002, p. 626)  

17-Humberto de Alencar Castelo Branco (1897-1967)- Poucas semanas antes de se tornar ditador, o general destila seu reacionarismo hidrófobo em circular reservada:

“Entraram as Forças Armadas numa revolução para entregar o Brasil a um grupo que quer dominá-lo para mandar e desmandar e mesmo para gozar o poder? Para garantir a plenitude do grupamento pseudo-sindical, cuja cúpula vive na agitação subversiva cada vez mais onerosa aos cofres públicos?  Para submeter a nação ao comunismo de Moscou? Isto, sim, é que seria antipátria, antinação e antipovo”.

(citado em BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz.  O governo João Goulart: as lutas sociais no Brasil, 1961-1964.  Rio de Janeiro: Revan; Brasília, UnB, 2001, pp. 166/167)

18-Roberto Marinho (1904-2003) explica como ajudou a salvar a democracia através da ditadura:

“Participamos da Revolução de 1964, identificados com os anseios nacionais, de preservação das instituições democráticas (!!!), ameaçados pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada.  Quando a nossa redação foi invadida por tropas anti-revolucionárias, mantivemo-nos firmes em nossa posição.  Prosseguimos apoiando o movimento vitorioso desde os primeiros momentos de correção de rumos até o atual processo de abertura que deverá consolidar-se com a posse do futuro presidente”.

(O Globo, editorial de 7 de outubro de 1984)   

19-Jânio Quadros (1917-1992)- O “Sr. Forças Ocultas" viaja na maionese com o objetivo de mobilizar os conservadores em torno de sua candidatura à Prefeitura de São Paulo (setembro de 1985):

“Enfrentamos uma conspiração de comunistas e comunistóides que persistem em desmoralizar militares de alta patente e civis que combatem o comunismo”.
(citado em SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Castelo a Tancredo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p. 510)

20-Miguel Reale (1910-2006)- O ilustre jurista mostra sua visão “doce” sobre a colonização:

Mas o importante é que em Casa-Grande & Senzala nós temos uma visão realista da sociedade colonial. Faltando mulheres brancas, as mulheres negras ocuparam o cenário. Havia uma vida sexual inegavelmente condicionando o relacionamento social. Além do grande apetite sexual do senhor de engenho, tinha ele à sua disposição a doçura das escravas.


21- Nivaldo Cordeiro, colunista do Mídia sem Máscara, apresenta sua versão apologética de “nossa” última ditadura:

“É bom lembrar que os militares brasileiros, que detinham o poder, voluntariamente o devolveram aos civis, não sem antes pôr para correr os traidores da pátria. Em gesto de grandeza instituíram a Lei da Anistia, que a cambada terrorista agora quer anular para tornar réus aqueles generosos combatentes. Não se lembram do mal que praticaram. De tudo fazem peça de propaganda contra os militares vencedores”. 


22-Klauber Cristofen Pires, também do Mídia sem Máscara, e suas elucubrações sobre a rede de ensino:

No mínimo, as crianças e os jovens iam pra escola para aprender – e aprendiam mesmo(!) – coisas como Matemática, Português, Ciências e Línguas, mas muito mais do que isto, aprendiam a respeitar os mestres, a cuidar do patrimônio público e a serem patriotas. Toda sexta-feira era dia de cantar o hino nacional. Hoje as escolas não passam de bocas de fumo onde os jovens sofrem o assédio sexual da ideologia gayzista e sexualista e onde a única disciplina é a luta de classes marxista.


23-Heitor de Paola- O psicanalista do Mídia sem Máscara faz uma “análise” bem heterodoxa do quadro partidário brasileiro:  

Assim estão os anestesiados liberais e conservadores brasileiros: presos entre comunistas 'bonzinhos' do PSDB e 'mauzinhos' do PT, sentem-se tentados a entregar o seu voto aos primeiros, enquanto - como bem o diz Garrido - eles vão deslocando o eixo de opções cada vez mais à esquerda! 


24-Ipojuca Pontes- Cineasta da extrema direita lamenta a tentativa abortada de se produzir mais um panfleto pró-1964:
Resumo da ópera: numa era em que a história política e militar do Brasil contemporâneo vem sendo contada por tipos como Elio Gaspari - um ex-repórter de "Novos Rumos", antigo panfleto comunista -, se constituiu erro grave - mesmo imperdoável - não se ter publicado, para o amplo conhecimento público, "O Livro Negro do Terrorismo no Brasil". Com a sua edição, provavelmente seria mais difícil para Lula e os revanchistas do PT, uma legenda composta por comunistas corruptos e terroristas das mais diversas facções, criarem o famigerado Programa Nacional dos Direitos Humanos e sua "Comissão da Verdade", com o objetivo canalha de revogar a Lei da Anistia, acuar as Forças Armadas e punir os militares que salvaram o país das garras do comunismo. Afinal, lidando com a ralé vermelha, a verdade histórica deve ser dada a conhecer, obrigatoriamente, custe o que custar.
25- Diogo Mainardi, dispensando explicações:
Analisando a campanha de Canudos, Euclides da Cunha delineou perfeitamente o caráter nacional. Os fanáticos de Antônio Conselheiro eram uns “broncos”, uns “primitivos”, uns “retardatários”, uns “retrógrados”, uns “impotentes”, uns “passivos”. Eles eram “uma turba de neuróticos vulgares”, de “desvairados”, de “desequilibrados incuráveis”. Eles eram “uma gente ínfima e suspeita, avessa ao trabalho, vezada à mândria e à rapina”. Eles eram dotados de uma “moralidade rudimentar”, com uma série de “atributos que impediam a vida num meio mais adiantado e complexo”. Eles eram um retorno “ao estádio mental dos tipos ancestrais da espécie”. Euclides da Cunha compreendeu a mente e o comportamento dos brasileiros. Ao contrário de mim, ele jamais teria errado o resultado eleitoral.
26- O deputado federal Jair Bolsonaro revoluciona a psicologia:
“Quando se perde o argumento me acusam de estar à procura de votos. Se posso mudar o comportamento de um filho agressivo ou desrespeitoso por que não poderia mudar o efeminado com a mesma atitude? Homossexualismo, como regra, é comportamento e não genética”.
27-Julio Severo- O pastor ultra-homofóbico nos revela que os três principais candidatos na última eleição presidencial eram comunistas a serviço do rabudo:
Na minha humilde opinião, a solução para o Brasil é o povo chorar, jejuar e sair às ruas, pois o marxismo demoníaco está - seja através de Dilma, Serra ou Marina - com o controle total desta eleição presidencial. Só Jesus Cristo pode salvar o Brasil.
28- Félix Maier, outro colunista do MSM, “corrige” autodefinições alheias para “combater o racismo”:
O que se estranha é que os ditos grupos de "defesa de afrodescendentes" queiram chamar de negra, p. ex., uma morena como Thaís Araújo ou Camila Pitanga. Elas têm, digamos, uns 50% de sangue branco e outros 50% de sangue negro. São, naturalmente, "morenas", não "negras", como muitos (racistas de cor?) querem impor. Chamá-las de "negras" equivale a chamá-las também de "brancas", o que efetivamente elas também não são. Nesse mesmo erro incorreu Paula Barreto, branca, filha do produtor de cinema Luís Carlos Barreto, que se casou com o jogador de futebol Cláudio Adão, e que não aceita a denominação do termo "pardo": "Tenho horror a ele. É feio, preconceituoso. Meus filhos são negros e são felizes" (in Racismo Cordial - A mais completa análise sobre preconceito de cor no Brasil, Editora Ática, São Paulo, 1995. pg. 38). Pelo visto, virou mesmo moda de muito "moreno-claro" se apresentar como "negro", só para acompanhar a onda "politicamente correta" em voga. Colocar uma cor acima da outra é racismo puro.
29- Reditario Cassol, suplente de senador em exercício pelo PP de Rondônia, a favor da oficialização dos castigos físicos nas prisões (sessão de 06/10/2011):
“Nós temos de fazer o nosso trabalho, ilustre presidente e nobres senadores, modificar um pouco a lei aqui no nosso Brasil, que venha favorecer, sim, as famílias honestas, as famílias que trabalham, que lutam, que pagam impostos para manter o Brasil de pé. (...) E não criar facilidade para pilantra, vagabundo, sem-vergonha, que devia estar atrás da grade de noite e de dia trabalhar, e quando não trabalhasse de acordo, o chicote voltar, que nem antigamente”.

Postado por Dom Bertrand em www.paznocampo.org.br/blog/blog_db.asp

30- Durval Lourenço Pereira Júnior, produtor do documentário O Lapa Azul, descreve como a subversiva televisão brasileira contribui para o sucesso da conspiração nacional da esquerda:

“Para mudar este quadro, é preciso lançar no seio da sociedade o vírus da discórdia e da contestação dos valores familiares, éticos e religiosos. A televisão, como formadora de opinião, tem participação intensa nesse processo, particularmente com a dramaturgia das novelas e sua temática cada vez mais ousada e libertina. A todo momento afloram na mídia uma série de novas ‘questões sociais’: como a do ‘beijo homossexual’; da liberação do uso de drogas; da ‘luta em defesa das minorias’; sem-terra, sem-teto, negros, indígenas, homossexuais, e por aí vai. Quem por acaso acompanhar as constantes passeatas e manifestações públicas que envolvem tais questões, há de perceber a grande quantidade de bandeiras de partidos políticos. Quase todas na cor vermelha, é claro”.

Em: http://www.escolasempartido.org/?id=38,1,article,2,230,sid,1,ch 

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Considerações sobre certo "antirracialismo"









Roberta Fragoso Kaufmann, advogada do DEM, defendeu nos últimos dias as diretrizes deste partido no Supremo Tribunal Federal.  Como foi amplamente noticiado, os ex-pefelistas impetraram uma ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) contra o sistema de cotas raciais instituído na Universidade de Brasília (UnB).  Não terei como foco principal, nesta postagem, a questão das cotas. Já deixei bem definidas minhas opiniões sobre o tema em texto muito recente.  O que me inquieta, na verdade, é uma breve exposição de Roberta contra a implantação de medidas de ação afirmativa no Brasil, divulgada no site do Instituto Millenium:


            Os argumentos não são exatamente originais, mas a advogada sustenta com fervor duas teses muito caras à maioria dos conservadores brasileiros, ainda que não estejam formuladas exatamente nestes termos:

1)Não existem, a rigor, problemas étnicos no Brasil.

2)As desigualdades sociais entre brancos e negros refletem apenas as diferenças, verificadas em passado mais ou menos distante, no campo das oportunidades econômicas.

            Como discordo radicalmente destas premissas, comentarei alguns trechos do artigo de Roberta.   

Alguém poderia me ensinar qual é o limite exato entre um pardo e um branco no Brasil? Será que preciso andar com uma cartela de cores igual à das lojas de pintura para que esta definição seja precisa e possa fazer algum sentido?

            Um recurso típico dos adversários das cotas é a biologização das questões étnicas; ao invés de se reportarem ao elemento fundamental, o identitário (como me vejo e como sou visto), tentam embaralhar o debate com afirmativas do tipo “Os negros têm sangue branco e os brancos têm sangue negro”.  Roberta Kaufmann vai além e, incorrendo exatamente em um erro que pretende criticar, vincula as identidades étnicas à cor da pele dos indivíduos, coisa que causaria arrepios em qualquer antropólogo.  Mas devo responder objetivamente: um pardo é uma pessoa que se entende como mestiço afrodescendente, não importando se sua cútis é marrom escura, avermelhada ou amarelada, se possui ou não os marcadores X, Y e Z em seu DNA, se tem cabelo crespo, liso ou ondulado.  Um branco é alguém plenamente identificado com sua origem europeia (ou, em alguns casos, sírio-libanesa, turca, judaica), mesmo que a pesquisa genealógica demonstre que uma de suas bisavós foi escrava nascida no Congo.      

Não por acaso, na única pesquisa de amostragem em que o entrevistado foi livre para dizer à que cor pertencia, o resultado em terras tupiniquins foram impressionantes 135 possibilidades, em uma mostra criativa que nem o Aurélio é capaz de reproduzir.

            A multiplicidade de autodefinições, tantas vezes mencionada pelos crentes na democracia racial, aponta para o contrário do que Roberta gostaria de provar: em primeiro lugar, quando um entrevistado diz que sua cor é “negrota”, “verde”, “saraúba”, “pouco clara” ou “branca suja”, revela inequivocamente a escassez de oportunidades para se instruir, que sempre foi uma das principais mazelas da população negra brasileira; em segundo, deixa igualmente óbvia a forte hierarquização étnica que existe na sociedade: muitas pessoas têm vergonha de se definir para estranhos como negras, pardas ou mulatas, palavras simples, de fácil compreensão e de uso corrente em todas as classes.    

Esta exposição se torna melancólica em relação ao nosso país quando se percebe que se a Corte Constitucional conceder o beneplácito à instituição das políticas de cotas raciais em Universidades, como é o caso hoje em julgamento, paulatinamente as cotas raciais serão estabelecidas em todos os setores sociais, como pretendido pela Secretaria de Igualdade Racial, beneficiando tão-somente uma casta de privilegiados de classe média e alta de negros que não seriam os mais necessitados da ajuda estatal.

            Temos neste parágrafo uma forte contradição para uma profissional com a projeção de Roberta Kaufmann: caso as cotas se ampliem para “todos os setores sociais”, o que inclusive considero coerente, é ilógico que venham a beneficiar somente os negros “de classe média e alta”.  Alguém consegue imaginar que os filhos de advogados, médicos e engenheiros negros se candidatarão a vagas de caixa de supermercado e balconista de farmácia?  

Em vez de observarmos o Brasil como exemplo para o mundo do século XXI, a partir do convívio harmônico entre brasileiros natos e imigrantes das mais diferentes culturas, religiões e cores, ativo absolutamente estratégico nesse século de tantos conflitos, pretende-se promover o dissenso e a divisão de nossa unidade nacional.

            Desconheço o que Roberta entende como convívio harmônico, mas julgo absurdo o emprego desta expressão quando as pessoas instruídas, de maneira geral, sabem que o Brasil foi, durante o final do século XIX e boa parte do XX, um país de imigração seletiva, cujos governantes assumiam sem disfarce seu objetivo de branquear progressivamente a população.  Durante várias gerações, diretores de faculdades de Medicina, juristas, sociólogos e outros intelectuais redigiram obras proclamando a inferioridade biológica do negro, visão que se estendeu, direta ou indiretamente, a todos os níveis do ensino público e particular.  Não acredito na viabilidade do projeto de apresentar ao mundo como exemplo uma sociedade em que a subalternidade de uma parcela enorme de seus integrantes é praticamente naturalizada por segmentos numerosos.  Muitos brasilianistas já denunciaram a falsidade da lenda.                          

Podemos ser criativos e elaborarmos um modelo próprio de ação afirmativa para a necessária integração dos negros carentes no Brasil. Cotas sociais, sim! Cotas raciais, não! Porque a pobreza, no Brasil, é a grande causa da segregação.

            Roberta Kaufmann fecha o libelo com seu engano mais grave: se é certo que a pobreza se distribui por todas as etnias, aliás de maneira nada “equilibrada”, existem circunstâncias perversas que não podem ser explicadas por critérios de renda.  Recorro de passagem ao Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil; 2007-2008, organizado por Marcelo Paixão e Luiz Carvano, vinculados ao Instituto de Economia da UFRJ.  Os dados apresentados nesta publicação indicam que a vida de pessoas não-brancas, no país, vale muito menos do que a de pessoas brancas, ou no mínimo que existe uma presunção generalizada de impunidade no que se refere ao assassínio de não-brancos.  Ainda que levemos em conta o declínio da oferta de serviços de segurança pública segundo os bairros em que predominam as diversas classes sociais, a desproporção é gritante:        

“A razão de mortalidade por 100 mil habitantes de homens pretos e pardos por armas de fogo foi, em 2005, de 45. Entre os homens brancos, de 24,2.  No caso das mulheres, foram: pretas e pardas, 2,5; brancas, 1,8[1]”.

            Como se não bastasse a possibilidade nunca desprezível de fuzilamento por bandidos, policiais ou mesmo vizinhos enfurecidos, os negros se defrontam com outro problema também muito evidente: por mais que se qualifiquem intelectualmente, nada garante que obterão reconhecimento enquanto trabalhadores intelectuais.  Nem tampouco que o Estado capitalista vá ampliar satisfatoriamente a rede de ensino de maneira a contemplar todos os que desejam chegar aos níveis mais altos de escolaridade. Encaremos com realismo mais algumas estatísticas:    

A proporção de pretos e pardos ocupados, com pelo menos o ensino médio completo, em 2006, equivalia à situação dos brancos onze anos antes, em 1995.  Do mesmo modo, apesar de ter praticamente dobrado o percentual de ocupados pretos e pardos com nível superior- de 1,9%, em 1995, para 3,7% em 2006-, o peso dos diplomados com este nível de instrução, comparativamente à distribuição dos ocupados brancos por nível de instrução- de 13,5% neste caso-, correspondia a menos de um terço que o dos brancos[2].

            Por todas estas razões, eu digo: Cotas sociais, sim! Cotas raciais, sim! Não à intenção de segregação camuflada pelo discurso da igualdade formal!  




[1] Relatório..., p. 181.
[2] Idem, p. 92.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Balelas sortidas de Olavo de Carvalho


           Prossigo hoje com a exposição da “História Paralela” de Olavo de Carvalho.  Um único post seria insuficiente para dimensionar tão longa carreira de manipulação ideológica em favor das velhas e novas oligarquias.  Para começar, temos uma visão (melhor dizendo, cegueira) muito peculiar sobre o golpe de 31 de março:  


A derrubada do presidente foi um ato legítimo, apoiado pelo Congresso e por toda a opinião pública, expressa na maior manifestação de massas de toda a história nacional (sim, a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade” foi bem maior do que todas as passeatas subseqüentes contra a ditadura).

Olavo tinha quase dezessete anos quando o golpe foi desfechado.  Teria sido um adolescente recluso?  Comício da Central à parte, ninguém mais viu a tal unanimidade da “opinião pública”, a começar pelo Ibope, que constatou no ano anterior a folgada predominância da aprovação sobre a reprovação a João Goulart em dez metrópoles brasileiras[1].  O primarismo é tão grande que se torna até desnecessário comparar os números da Marcha da Família com os da Campanha das Diretas.     



                O “filósofo sem diploma”, em seu macarthismo tardio, pode até pensar que o Ibope era (ou é) uma instituição comprada pelos comunistas.  Mas o embaixador americano Lincoln Gordon não endossaria sua opinião.  Muito satisfeito com os fatos em curso no mês de abril de 1964, ele não deixou de lamentar a falta de entusiasmo dos pobres[2]:


            A situação não melhora quando Olavo funde a “História Paralela” com a “Sociologia de Botequim”.  Saem pérolas deste tipo:


A democracia em sentido estrito só deu certo na Inglaterra e nos EUA, porque os povos anglo-saxônicos foram preparados para ela, primeiro, pelo cristianismo (os ingleses cristianizaram-se bem antes do resto da Europa);

            Qualquer pessoa adulta que tenha feito uma boa quinta série sabe que, algum tempo após a retirada das tropas romanas, a Bretanha foi ocupada por anglos e saxões, povos germânicos que rapidamente se fundiram.  Como todos os germânicos da Antiguidade que viviam além das fronteiras romanas, os anglo-saxões, que vieram a subjugar os habitantes da ilha (romanizados ou não), eram politeístas.  Uma breve nota de Perry Anderson nos indica, ao contrário do que afirma Olavo, que a Inglaterra foi cristianizada “com atraso”, se comparada à França e à Península Ibérica[3].  Diante do despropositado chute, surge uma questão: imaginemos que o auto-exilado estivesse certo e os proto-ingleses adotassem o Cristianismo cem anos antes dos outros europeus ocidentais.  De que maneira esta particularidade poderia ser um fator determinante para a evolução política verificada mais de um milênio depois?


            Malabarista nato, Olavo faz o que pode pela memória do franquismo, reconhecendo-o como uma ditadura de direita, mas concedendo-lhe a circunstância atenuante de se contrapor a uma outra ditadura, a republicana:


A república espanhola foi obviamente uma ditadura, e entre ela e a ditadura franquista que a sucedeu Alberto Dines, desmentindo seu fingido horror a comparações dessa ordem, não hesita em estabelecer uma gradação de preferências, com o agravante de que, nessa gradação, não se limita a cotejar a extensão de dois males, mas eleva um deles ao estatuto de um bem, ao afirmar que os “libertários do mundo inteiro” – assim ele qualifica os membros das Brigadas Internacionais – lutavam pelos “conceitos de República, democracia e solidariedade”.

            Nada mais fácil de desmascarar.  Apesar de todos os conflitos de classe que a caracterizam, a República Espanhola da década de 1930 foi um regime constitucional e pluripartidário.  Como se depreende da leitura da Pierre Vilar, diversas correntes da direita e da esquerda locais participavam das eleições e estavam representadas no Parlamento[4].  Equiparar os generais conservadores autoritários e os militantes fascistas que não aceitavam o resultado das urnas aos governantes eleitos segundo as regras constitucionais é uma piada de péssimo gosto.   

    

 
             Péssimo em História Geral, Olavo às vezes parece nunca ter vivido no Brasil. Ele ainda acredita na democracia racial: 


Nunca houve no Brasil partido racista, militância racista, pregação racista, imprensa racista, comícios racistas, panfletos racistas, filmes racistas, programas de rádio ou peças de teatro racistas.

            Mostremos a ele, antes que seja tarde demais, que Papai Noel não existe.  O tema é vasto e comporta um tratado de duas mil páginas, mas fiquemos, por enquanto, limitados a dois casos.  Raymundo Nina Rodrigues se deu ao trabalho de escrever um livro inteiro (do qual apresento um pequeno extrato[5]) para justificar sua tese de que os não-brancos deveriam ser apenas parcialmente imputáveis.  Olavo de Carvalho simplesmente se nega a reconhecê-lo como pregador racista!   


           Na mesma época, os demais vereadores eleitos para formar a Câmara Municipal de Santos se recusaram a receber seus diplomas junto com o líder negro Quintino de Lacerda[6].  Admitamos a razão de Olavo: eles não eram filiados ao Partido Racista Brasileiro!!! 


         Porém, entre todas as distorções e falácias, nada agrada mais a Olavo do que produzir acusações contra comunistas.  Vejamos um exemplo:


Toda a tecnologia genocida dos campos de concentração foi inventada pelos soviéticos.

            Fico na obrigação de frustrá-lo mais uma vez.  Mais de vinte anos antes da Revolução de Outubro, o general espanhol Valeriano Weyler já confinava em condições subumanas centenas de milhares de camponeses cubanos partidários da independência[7]:


         Caso não queiram reconhecer a paternidade espanhola dos campos de concentração, as olavetes e seu líder ao menos devem aceitar a inglesa, visto que o sistema foi atualizado poucos anos depois, na África do Sul[8].



          Conforme-se, Olavo de Carvalho: as técnicas de genocídio sistemático empregadas no século XX são fruto do colonialismo europeu do final do XIX, intimamente associado ao capitalismo.  Como se diz coloquialmente, toma que o filho é teu!
            A influência que este homem (uma espécie de Paulo Francis sem muita graça) consegue exercer sobre milhares de jovens prova definitivamente que há muito a fazer pelo sistema educacional brasileiro. 


[1] Ver Luiz Alberto Moniz Bandeira.  O governo João Goulart: as lutas sociais no Brasil, 1961-1964.  Rio de Janeiro: Revan, 2001, pp. 185/186.   
[2] Idem, p. 182.
[3] Ver Perry Anderson. Passagens da Antiguidade ao Feudalismo.  São Paulo: Brasiliense, 1987, p. 121. 
[4] Cf. Pierre Vilar.  A guerra da Espanha: 1936-1939.  São Paulo: Paz e Terra, 1989, pp. 31/32. 
[5] Nina Rodrigues.   As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil. Bahia, 1894, p. 47.  
[6] Ver Ana Lúcia Duarte Lanna.  Uma cidade na transição: Santos, 1870-1913.  São Paulo: Hucitec; Santos: Prefeitura Municipal, 1996, p. 194.
[7] Cf. Richard Gott.  Cuba: uma nova história.  Rio de Janeiro: Zahar, 2006, p. 114. 
[8] Ver Wesseling.  Dividir para dominar: a partilha da África 1880-1914.  Rio de Janeiro: UFRJ/Revan, 1998, pp. 357/358.  

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Balelas de Olavo de Carvalho: árabes, africanos e europeus


         Olavo de Carvalho, “filósofo e jornalista sem diploma”, é uma das maiores celebridades conservadoras da Internet, na qual constantemente se queixa da falta de reconhecimento institucional e produz teorias da conspiração em doses generosas.  Previsivelmente, em boa parte de seus artigos os muçulmanos ocupam o papel de vilões, de ameaça constante à civilização ocidental.  Todavia, no afã de combater o “inimigo”, ele não economiza disparates e juízos de valor que mais caberiam ao chefe de uma torcida organizada. Refratário a Barack Obama, a quem acusa alternadamente de ser muçulmano, comunista e queniano, Olavo emitiu a seguinte pérola em texto de 2008:         


O Islam, religião que ele herdou do pai e da qual obteve sua primeira educação na Indonésia, é a cultura mais escravagista dos últimos dois milênios.

Deixemos Obama em paz para investigar o mérito da questão.  Faço uso das estatísticas mais confiáveis segundo Paul Lovejoy[1], um dos mais categorizados especialistas no que se refere ao tráfico.  Pela soma das tabelas 2.1 e 2.2, temos cerca de 7,22 milhões de escravos africanos enviados para o mundo muçulmano entre 650 e 1600.  Acrescendo a estes números mais 2,2 milhões no período entre 1600 e 1800 (tabela 3.7), os 347 mil levados para Arábia, Pérsia e Índia no século XIX (partindo do duvidoso princípio de que o tráfico para a Índia só envolvia muçulmanos) e admitindo para a região saariana, também no Oitocentos, o 1,2 milhão da tabela 7.1 (mais abaixo), chegaremos a um total próximo a 11 milhões, em aproximadamente 1.250 anos.   
     


Verifiquemos agora as cifras do comércio negreiro empreendido pelos europeus.  O número de africanos que cruzou o Atlântico entre 1500 e 1800 é calculado em 7.766.000.  Nestes trezentos anos, portanto, o total excede o do tráfico muçulmano nos novecentos e cinquenta anos entre 650 e 1600.  Acrescentando a estimativa de 3.466.000 relativa ao século XIX, são mais de 11 milhões, não computando a área periférica das Ilhas Mascarenhas, colonizadas pela França, e o tráfico português do século XV [2].  Na melhor das hipóteses para Olavo de Carvalho, o quadro seria de um tenebroso empate técnico.  Analisando mais friamente, concluiremos que a transferência de mais de 6 milhões de homens e mulheres da África para a América, somente no século XVIII, é um processo sem paralelo na História, que não pode ser minimizado ou justificado.    
  

               Sigamos com os absurdos do exótico guru.  Em setembro de 2009, Olavo de Carvalho denunciava uma hecatombe de enormes proporções:   


Foram os árabes que os destruíram, na sanha de tudo islamizar à força. Boa parte da região que vai desde o Marrocos, a Líbia, a Argélia e o Egito até o Sudão e a Etiópia era cristã até que os muçulmanos chegaram, queimaram as igrejas e venderam os cristãos como escravos.

             Chegando à África do Norte, os árabes conquistaram efetivamente ao Império Bizantino a área que hoje se estende do Egito ao Marrocos. O genocídio generalizado dos cristãos, por sua vez, fica restrito aos delírios de Olavo.  O historiador Albert Hourani (1915-1993), britânico filho de libaneses cristãos, deixa claro não apenas que o domínio bizantino era visto como inconveniente para muitos do que não eram de origem grega, como também que os islâmicos toleraram o culto de “vários grupos cristãos[3]”.  A existência da numerosa minoria copta no Egito contemporâneo, na verdade, já seria suficiente para desacreditar tamanha bobagem.
       Pela leitura de Ricardo da Costa, nota-se que a invasão muçulmana da Península Ibérica, no início do século VIII, contou com o apoio logístico de nobres visigodos insatisfeitos com o resultado das recentes disputas pela sucessão do trono[4].  É inconcebível que o fizessem se o precedente, na vizinha África do Norte, fosse um banho de sangue.

  

       Para arrematar, registro que o historiador português José Hermano Saraiva, prestador de bons serviços ao salazarismo, descreve a dominação islâmica em Portugal como uma época de tolerância religiosa, sem qualquer menção à "queima de igrejas” ou processo semelhante[5]:


          No mesmo texto, Olavo retorna ao tráfico apenas para deixar claro que, quando desconhece um determinado assunto, fabrica dados aleatoriamente:  

se os europeus trouxeram para as Américas algo entre doze e quinze milhões de escravos, os mercadores árabes levaram para os países islâmicos aproximadamente outro tanto, com três diferenças: (1) foram eles que os aprisionaram - coisa que os europeus nunca fizeram, exceto em Angola e por breve tempo –

        Lamento decepcionar as olavetes.  É óbvio que o tráfico "consentido" para o Ocidente superou em muito a captura direta, pois não haveria meios para apanhar mais de 11 milhões de pessoas a laço em menos de quatro séculos.  Porém, o insuspeito Charles Boxer (1904-2000), oficial do serviço secreto britânico, nos ensina que antes da metade do século XV, quando os europeus ainda não haviam chegado a Angola, os portugueses já promoviam razias em busca de escravos na África Ocidental e nas Ilhas Canárias[6]





        Quanto ao tráfico islâmico, valem as mesmas afirmativas.  Houve aprisionamento direto, bem como comércio institucionalizado.  Sobre este último, o especialista brasileiro Alberto da Costa e Silva revela que o Egito muçulmano do século VIII era abastecido “pacificamente” de mão de obra cativa pelos Estados cristãos da Núbia, que, formalmente tributários do Islã, não deixavam de ter ganhos com este tipo de transação[7].  Em resumo: para os traficantes, o que importava era arrebatar a “carga” desejada, empregando os métodos que estivessem ao seu alcance.  Tentar hierarquizá-los segundo o credo é completamente ridículo.  


                 Não obstante a ignorância já demonstrada, Olavo até consegue ter razão em uma de suas acusações ao Islã:

(3) continuaram praticando o tráfico de escravos até o século XX.

                    Existem muitas referências à escravidão em terras muçulmanas no século XX.  O que não se compreende é o triunfalismo pró-europeu do veterano reacionário, visto que a França e a Inglaterra, nações listadas no rol das mais civilizadas, toleraram o cativeiro em seus domínios africanos até tempos inimagináveis para a maior parte do público ocidental, conforme dados também expostos por Paul Lovejoy[8].




                     Como o que começa mal tende a terminar ainda pior, Olavo de Carvalho não se esquece de anexar mais um item à conspiração gramsciana mundial: 

O escravagismo árabe foi assunto proibido por muito tempo, mas o tabu pode-se considerar rompido desde que a editora Gallimard, a mais prestigiosa da Franca, consentiu em publicar o excelente estudo do autor africano Tidiane N'Diaye, Le Genocide Voilé (2008), que comentarei outro dia.

                Sou forçado à pergunta: de onde Olavo faz nascerem tantos palpites sem nexo?   Pelas referências contidas nas tabelas aqui exibidas, percebemos que vários autores quantificaram, nas décadas de 1970 e 1980, o tráfico islâmico.  No Brasil, há vinte anos, Alberto da Costa e Silva já descrevia, a partir de seus estudos africanos, muito sobre a escravidão entre os muçulmanos.  Onde existe o tal tabu? Na Virgínia, terra do auto-exílio de Olavo de Carvalho?
                   Olavo pretende ser a grande cabeça pensante da direita brasileira.  Pena que não é.  O socialismo se concretizaria amanhã!      






[1] Ver Paul Lovejoy.  A escravidão na África: uma história de suas transformações.  Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, pp. 61, 108 e 235.  
[2] Idem, pp. 90 e 217.
[3] Ver Albert Hourani.  Uma história dos povos árabes.  São Paulo: Companhia das Letras, 1994, p. 40.
[4] Cf. Ricardo da Costa.  A guerra na Idade Média.  Rio de Janeiro: Edições Paratodos, 1998, p. 64.
[5] Ver José Hermano Saraiva.  Breve história de Portugal.  Lisboa: Bertrand, 1989. p. 17.
[6] Ver Charles R. Boxer.  O império marítimo português (1415-1825).  Lisboa: Edições 70, 2001, p. 41.
[7] Cf. Alberto da Costa e Silva.  A enxada e a lança: a África antes dos portugueses.  Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: Edusp, 1992, p. 217.
[8] Cf. Paul Lovejoy.  Op. cit, pp. 366 e 389.