Visito hoje (como combater o velho vício?) um dos sites conservadores de maior visibilidade no Brasil: http://www.escolasempartido.org . Poucas vezes tive a oportunidade de registrar tanta incoerência em exposições tão pouco extensas, em sua maioria. Seu idealizador, o advogado Miguel Nagib, inicia o texto de apresentação (http://www.escolasempartido.org/?id=38,1,topico,2,22,new_topic) com a pérola, supostamente libertária, que transcrevo abaixo:
Numa
sociedade livre, as escolas deveriam funcionar como centros de produção e
difusão do conhecimento, abertos às mais diversas perspectivas de investigação
e capazes, por isso, de refletir, com neutralidade e equilíbrio, os infinitos
matizes da realidade.
Confronto a pregação pluralista
com o elenco de articulistas cuja produção é divulgada por Nagib: Reinaldo
Azevedo, Olavo de Carvalho, Thomas Sowell, Miguel Reale, Meira Penna, Diego
Casagrande e alguns outros menos célebres, mas infalivelmente liberais
conservadores, quando não conservadores autoritários. Poderíamos, assim, alterar os termos do libelo,
tornando-os verdadeiros: “Viva a diversidade, desde que todos se coloquem à
direita”. Para completar a lista das
boas companhias, a administração do site enumera entre as suas “novidades” um
vídeo do senador sem partido Demóstenes Torres: http://www.youtube.com/watch?v=X6aVC-zQqL0 . Façamos a seguir uma pergunta indiscreta: teria
Carlinhos Cachoeira alguma preocupação de natureza pedagógica?
Calculo o quanto é sincera
a defesa da liberdade de pensamento (igualmente declarada no link de apresentação) a
partir da leitura do panfleto do jurista Reale “Por uma educação liberal” (http://www.escolasempartido.org/?id=38,1,article,2,33,sid,1,ch). Deixo de lado a divertida contradição de um
movimento que, supostamente contrário à doutrinação ideológica, confere
destaque a um título que sugere doutrinação com sinal contrário. Observemos com
atenção o tom dos lamentos de Miguel Reale:
Verifiquei, por exemplo, que 90% dos livros de
autores marxistas (Ianni, Caio Prado, Furtado, Konder, etc.) foram publicados
ao tempo em que, supostamente, dominava a “linha dura” militar (1968/80) que
impusera a censura do pensamento. Acontece que os militares, não muito sutis,
como é notório, acreditavam ser necessário censurar os jornais. Mas como não
costumavam ler livro algum, deixavam aos editores a liberdade de publicar o que
bem entendessem e, desse modo, foi a “Ideologia Brasileira” toda ela
gramscianamente edificada, a partir dos próprios bancos escolares, sobre o mais
primário bestialógico.
Não
é necessário ter um alcance interpretativo superior ao do mais truculento
“linha dura” para entender que, na perspectiva de Reale, o mal da censura foi seu
caráter incompleto! O mesmo viés
direitista/autoritário fica evidente quando Miguel Nagib, ainda na
apresentação, deixa claro que inimigo está combatendo:
(...) se observa que estão engajados na execução de um
projeto de engenharia social, que supõe a implementação de uma nova escala de
valores, envie-nos uma mensagem relatando sua experiência (acompanhada, se
possível, de elementos que possam comprová-la).
Na
expressão “engenharia social” nada temos além de um antigo clichê liberal, de
conotação pejorativa, empregado contra os projetos socialistas de transformação
das relações de poder. Quando Nagib recusa
a “nova escala de valores”, subentende-se que pretende proteger a velha. Os adeptos da Escola Sem Partido não se
revoltam exatamente pelo fato de alguns professores ministrarem aulas com forte
carga ideológica, mas sim pelo que estes conseguem no sentido de erodir os
componentes conservadores na mentalidade dos alunos.
Apesar
de coordenar uma organização tão obviamente parcial e (não há termo mais
preciso) doutrinária, Miguel Nagib, desafiando a paciência de qualquer leitor
que possua mais de quatro neurônios ativos, proclama que a Escola Sem Partido é
(...) uma
associação informal, independente, sem fins lucrativos e sem qualquer
espécie de vinculação política, ideológica ou partidária.
Tal afirmativa se choca por
completo com a exposição feita pelo próprio Nagib em artigo de fevereiro de
2011. Segundo o doutrinador (rótulo
inevitável), cabe aos “adversários ideológicos da esquerda” a tarefa de lutar
contra a expansão do pensamento esquerdista nas escolas. Ele não hesita em confessar que se inspirou
diretamente na batalha cultural dos conservadores norte-americanos contra o que
se compreende, naquele país, como liberalismo: a contestação dos paradigmas
tradicionais na vida social. Em
colocação infantil para quem se autodenomina apartidário, Miguel Nagib se
queixa do sucesso eleitoral do PT.
Desmascarada a patética alegação de
neutralidade da Escola Sem Partido, examinemos agora o método empregado pelos
reacionários para localizar seus fantasmas, no link “Flagrando o doutrinador” (http://www.escolasempartido.org/?id=38,1,topico,2,13,new_topic). O primarismo se aproxima, em certos momentos,
do inacreditável:
- se desvia freqüentemente da matéria objeto da disciplina para assuntos relacionados ao noticiário político ou internacional;
Vejamos:
como um professor de Geografia pode caracterizar os blocos econômicos
existentes na contemporaneidade sem se reportar ao noticiário
internacional? Estaria um professor de
História proibido, após sessão sobre as oligarquias fundiárias da Primeira
República, de avaliar comparativamente a atual influência do ruralismo no
Congresso Nacional? Numa aula de Química
ficam interditadas as curiosidades dos alunos a respeito da proliferação das armas
atômicas e da validade dos critérios pelos quais alguns países podem possuí-las
e outros não? Francamente...
Que propõem Miguel Nagib e seus
seguidores, uma espécie de Índex? Os
autores que são ou foram em qualquer época filiados a partidos políticos ou que
tenham publicado obras de natureza opinativa deverão ser descartados
sumariamente da produção de material didático? Quais
os livros que recolheremos primeiro, os de Demétrio Magnoli? Folgo em notar tanto apreço à liberdade!!!
- exibe aos alunos obras de arte de conteúdo
político-ideológico, submetendo-as à discussão em sala de aula, sem
fornecer os instrumentos necessários à descompactação da mensagem veiculada e
sem dar tempo aos alunos para refletir sobre o seu conteúdo;
Fico
a partir de agora sabendo que se estabelecer correlação entre uma foto do
quadro Guernica e o nazismo estarei
sujeito à patrulha ideológica (que me perdoem, mas novamente careço de vocabulário
mais apropriado) da Escola Sem Partido. Faltou
somente explicar como um assunto entra em discussão sem ter sua mensagem
descompactada, a menos que um monólogo incompreensível do professor seja
definido como discussão!
Diante
de tal cláusula, me vejo forçado a especular: quais são os santos do panteão de
Miguel Nagib? Quais seriam, em
contrapartida, os pobres mortais que podem ser ridicularizados e
desqualificados? Suponhamos que eu venha
a apresentar aos alunos o quadro Independência
ou Morte, de Pedro Américo; que comente, com imprudência, que a elevação do
solo nas proximidades do riacho Ipiranga foi uma livre criação do autor, que ao
invés do cavalo de raça retratado na imagem a montaria provavelmente era uma
mula (muito mais capaz de suportar as vicissitudes de uma viagem Rio-São Paulo),
e que segundo uma versão no dia 7 de setembro D. Pedro sofria de desarranjo
intestinal. Estarei incorrendo no abominável crime de difamação contra “nosso
primeiro imperador”?
- utiliza-se da função para propagar idéias e juízos de valor
incompatíveis com os sentimentos morais e religiosos dos alunos,
constrangendo-os por não partilharem das mesmas idéias e juízos.
Imaginemos,
talvez, que um professor de Biologia queira explicar o parentesco entre lhamas
e dromedários. Será censurado porque
para uma parte dos alunos o Evolucionismo é uma teoria diabólica? Voltemos a mim: se mostrar uma pintura
rupestre e disser que foi composta há cerca de doze mil anos estarei sujeito a
repreensão, já que alguns não acreditam que o Universo possa existir há mais de
seis mil? Fazendo o contrário, constrangerei
ilegalmente as pessoas que têm uma visão laica?
- transmite aos alunos a impressão de que o mundo da política
se divide entre os “do bem” e os “do mal”;
Estarrecedor! Estou gravemente equivocado ou Miguel Nagib e
seus adeptos fazem precisamente isto, só empregando, sem dúvida, sua própria
concepção a respeito de quem são os “do mal”?
Escola Sem Partido é uma autêntica sala de aula para os que desejam
realimentar seu espírito retrógrado. Quanto
à presunçosa intenção de constituir serviço de utilidade pública, nem faz jus a
uma avaliação.
A pedagogia sem partido é a pedagogia do opressor.É a pedagogia do ensino privado movimentado com recursos públicos.É a pedagogia das escolas militares...que prepara para a defesa do conservadorismo e defesa de valores externos tiranos. Mas isso não é uma maldição.A democracia avança.A história está sendo feita aqui e agora.Estamos transformando e mudando.O que não pode ser reciclado vai sendo desprezado pela maioria da sociedade.
ResponderExcluirEles estão certos - todos os lados podem atacar. Que vença o melhor menos mentiroso). Além do mais, as pessoas não agem como monta-se estes pseudo-artigos de blog como este - uma citação, uma réplica, um "super desmascara" -, ou seja, você está vendo o que voce quer ver. Vejo com bons olhos as admoestações..
ResponderExcluirP.s - Até a educação libertária dos anarquistas é opressora, ou seja, vocês não passam disso também. para de de pagar de fodão..
Discursos partidários, alfinetadas - fuja pras colinas, seus loucos.
Ao anônimo de 15 de abril
ResponderExcluirEu não disse que o problema "deles" é ser de direita, e sim apontei o quanto é patético o fato de um movimento tão parcial se declarar neutro, apartidário e coisas do gênero.
Quando ao "pseudo-artigo", tenho dúvidas se mereço este pseudo-comentário. Com toda a honestidade: você é muito desarticulado!
Não imagino de onde saiu o "meu anarquismo". Vá alguém entender! Tudo bem, enquadro nas cotas da turma do nonsense.
Entre o pessoal do Escola Sem Partido há muitos que são, mesmo, tão polarizados ideologicamente quanto aqueles que eles denunciam, mas isso não torna falsa a denúncia: tenho observado que o ensino, sobretudo de História e Geografia, está extremamente impregnado de um marxismo genérico, a ponto de ninguém nem reparar mais, todos acham aquilo normal. Também não acredito que a tal conspiração gramsciana que eles alardeiam tenha de fato o alcance mencionado, muito menos que os estudantes brasileiros vão se tornar Ches Guevaras quando adultos. Afinal, se você é professor do ensino médio, deve saber muito bem que quando os alunos não estão a fim de assimilar algum ensinamento, pode falar à vontade que entra por um ouvido e sai pelo outro. A tão falada doutrinação esquerdista nas escolas, no fim das contas, pode estar tendo um impacto tão profundo quanto as antigas aulas de Educação Moral e Cívica e OSPB do tempo dos militares.
ResponderExcluirMas se a doutrinação pode não ser tão eficaz para disseminar ideologias, por outro lado, ela é sempre eficaz para embobrecer o ensino e emburrecer o aluno. Por exemplo, a História, tal como muitos professores a tem ensinado, fica reduzida a um romance bobo onde estão os mocinhos de um lado e os bandidos do outro, ou então a um teatro burlesco onde todos os personagens são caricatos. É preciso reconhecer, o aluno gosta do que é mais fácil de entender, e o professor que diz coisas engraçados é considerado "legal". Mas venhamos e convenhamos: se a História se reduz a uma piada, então o professor de História se reduz a um palhaço! Eu fiquei horrorizado de folhear certos textos didádicos em uso por aí, utilizando linguagem quase chula em meio a grosseiros erros gramaticais, e invariavelmente procurando difamar e ridicularizar todos os nossos vultos históricos.
Dizem eles, é preciso mostrar o lado negativo dos nossos heróis, para que assim o aluno conheça as duas versões. Mas falar em negativo ou positivo é fazer um pré-julgamento. Não é esta a função do professor de História, pois tenham sido os personagens bons ou maus, o que eles fizeram e como fizeram é essencial para que entendamos os processos históricos que conduziram ao mundo atual, e como tal, os atos dessas pessoas deve ser apresentados com neutralidade e inseridos de seu contexto histórico. Por exemplo, se eu afirmar aqui que Adolf Hitler implementou uma espetacular recuperação econômica na Alemanha no início dos anos trinta, estarei apenas falando a verdade, e nem por isso eu sou um nazista!
Será que mostrar o quadro de Pedro Américo com Dom Pedro I montado em um vigoroso corcel, ao invés de uma mula, prejudica o entendimento do aluno sobre aquele período histórico? Mesmo que seja verdade, será que é pertinente lembrar que Dom Pedro I fez uma pausa às margens do rio Ipiranga porque estava com uma caganeira? Você realmente acredita que Dom Pedro era tão inconsequente, e o Brasil tão desimportante, que aquela caganeira foi fator determinante para a proclamação da independência, e não estivesse o imperador com um mal-estar intestinal, nossa história teria sido diferente? A mensagem, obviamente cretina, que se quer passar é de que se o Brasil foi o produto de uma caganeira, então somos um país de m*. A quem interessa passar tal mensagem?
Notei também que para alguns professores, o discurso engajado é uma espécie de muleta a que recorrem para compensar as deficiências de sua formação e de sua didática. A desculpa é que a "verdadeira função" do ensino não seria ministrar conhecimentos, mas "formar cidadãos", expressão de sentido vago que no mais das vezes significa veicular mensagens de conteúdo ideológico. Talvez seja isso o que estaja acontecendo em nossas escolas.
Rapaz,haja paciência para algumas das suas apelações! Esta então foi demais:
ResponderExcluir"A mensagem, obviamente cretina, que se quer passar é de que se o Brasil foi o produto de uma caganeira, então somos um país de m*."
Faça de conta que não entendeu a verdadeira mensagem: personalidades históricas não são peças de altar!
Breves considerações:
ResponderExcluir.O maior sonho do professor público é que sua turma nunca detone a sala, pelo menos nos seus tempos de aula. Nunca vi, em treze anos, qualquer professor levar uma cartilha debaixo do braço para dentro de classe e tentar formar um séquito político. Mesmo que quisesse, a alfabetização deficiente da maioria mataria o projeto no berço.
.Por outro lado, se você considerar doutrinação todo texto com uma carga ideológica, pequena, média ou intensa, todos nós somos doutrinadores. A mera escolha dos temas já é indício seguro de parcialidade.
.Quanto às escolas particulares, vale a pena assinalar que várias delas também exercem um belo patrulhamento à direita. Meus próprios filhos muitas vezes me demonstraram o fato, repetindo falas de professores que para mim foram bem surpreendentes.
.Você critica a tendência crítica aos "vultos", a exposição de suas facetas "negativas". Mas se esqueceu que positivo e negativo são basicamente juízos de valor? Se eu mostrar a um racista como Domingos Jorge Velho chacinava índios e quilombolas, ele vai idolatrar o bandeirante.
existe mais doutrinadores comunistas nas escolas privadas doque em escolas publicas, com certeza, ha masi comunistas por metro quedrado no alto pinheiros e morumbi em sp e mais comunistas por metro quadrado em ipanema, do que no resto do país. diga agora porque escrevi isto que sou de direita, e reponderei quem sou.
ExcluirAo último anônimo:
ResponderExcluirÉ possível que a sua tese seja verdadeira, mas gostaria de saber onde está o censo geral dos professores comunistas!
Só não entendi uma coisa: por que a sua possível identificação depende de uma provocação da minha parte?
Todos os professores de história que conheço- e são muitos - são comunistas e transbordam a sujeira socialista na sala de aula. Mas, claro, isso se deve apenas a uma anomalia estatística. Professor comunista tem de ser banido das escolas. Banido mesmo, chutado para a rua. Sala de aula não é lugar de cúmplice moral de genocídio. E não, não sou nazista, pois ser nazista também é ser socialista.
ResponderExcluirFiquei comovido com o espírito democrático do cidadão!
ExcluirSER NAZISTA NÃO É SER SOCIALISTA!!! São coisas EXTREMAMENTE DIFERENTES.
ExcluirSó uma questão: um professor de Sociologia deve ensinar a importância de Durkheim, Parsons, Malinovscki ou só mostrar a importância de Marx, Marcuse, Althusser?
ResponderExcluirQualquer curso de introdução à Sociologia obrigatoriamente traz rudimentos de Marx, Weber e Durkheim. Da mesma forma, não é possível ensinar historiografia sem apresentar as diversas correntes historiográficas.
ExcluirPedro Mundim foi muito feliz em suas observações.
ResponderExcluirFoi nada, só falou merda, como sempre.
Excluir"E não, não sou nazista, pois ser nazista também é ser socialista." - ta explicado rsrsrs
ResponderExcluirSer nazista é ser também socialista? Nossa, essa doeu no fígado! Analfabetismo político e desconhecimento total da história. Procure ler o pq do NSDAP ter recebido tal nome, (no qual estão as palavras Socialista e Trabalhador); você verá que não tem nada a ver com o mesmo sendo um partido "socialista"... muito menos "do trabalhador" (somente se o trabalho escravo realizado por pessoas que eram consideradas "não-humanas" pelos burocratas do partido for considerado como tal).
ExcluirAnalfabetismo político tem cura!