domingo, 25 de novembro de 2012

Um grande avô para os privatistas do ensino



        O Dr. Manoel de Queiroz Mattoso Ribeiro (1840-1914), morador da Corte, foi deputado provincial (cargo equivalente ao contemporâneo deputado estadual) pela província do Rio de Janeiro no biênio 1870/1871.  Representava o distrito eleitoral de Campos¹, que abrangia, a grosso modo, as municipalidades do norte fluminense.  Embora fosse filho de uma das maiores notabilidades do Segundo Reinado, o conselheiro Eusébio de Queiroz (1812-1868), aparentemente não ocupou postos muito relevantes durante o período monárquico.  Não o encontro na obra Parlamentares do Império, de Octaciano Nogueira e João Sereno Firmo (Brasília: Senado Federal, 1973), que salvo rara omissão contém as listagens dos mandatos de todos os integrantes da Câmara e do Senado de 1823 a 1889, incluindo ainda suas eventuais designações para as presidências de província.  Mattoso Ribeiro chegaria, entretanto, ao Senado na República, como suplente de Carlos Castrioto, que faleceu em 1894.  No auge da carreira política, entre os anos de 1896 e 1901, foi o vice-presidente daquela Casa². 
         Não avaliarei nesta matéria a projeção do parlamentar citado enquanto membro do Poder Legislativo regional, sua mais do que provável vinculação ao Partido Conservador (do qual seu pai foi um dos principais chefes), suas alianças ou rusgas com os demais deputados.  O que me despertou a atenção para este personagem algo obscuro foram as posições que adotou na sessão da Assembleia Provincial em 14 de outubro de 1870, na qual foi discutido um projeto sobre a implantação do ensino obrigatório no território fluminense.
       Reproduzir no espaço do blog todo o extenso debate daquela sessão excederia os limites do razoável.  Os que desejarem ler o texto integral podem acessar o programa de digitalização de periódicos da Biblioteca Nacional, a partir da seguinte página:  

http://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=218740&pasta=ano%20187&pesq=

       Enquanto o mesmo Carlos Castrioto que um dia lhe cederia involuntariamente uma vaga no Senado discursava com eloquência em prol da obrigatoriedade do aprendizado escolar, que julgava vital para um país dotado de sistema constitucional representativo, Mattoso Ribeiro se mostrava o mais enérgico entre os críticos do projeto.   


      A princípio, Mattoso Ribeiro combateu a proposta apresentando objeções de caráter econômico.  Segundo ele, os escassos recursos do Tesouro provincial seriam insuficientes para sustentar a universalização do ensino.  


      Porém, no calor da discussão, o deputado pelo distrito de Campos acabaria expondo convicções mais profundas.  Era francamente contrário à convivência entre crianças de origens sociais diferentes.  Emergem da fala breve, mas bastante instrutiva, a reprovação moral da pobreza, típica do liberalismo do século XIX, e o conceito positivo a respeito dos que "não têm de trabalhar", característico da classe senhorial do Império do Brasil.     


      Tal como um neoliberal de linha thatcherista, Mattoso Ribeiro pouco se importava com a penalização adicional imposta ao jovem pobre que, incapaz até de se vestir  adequadamente sem o auxílio do poder público, ficaria excluído da rede escolar em decorrência da pobreza.  Sua preocupação estava direcionada para as prováveis ofensas que sofreriam os que podiam pagar diante da presença de indesejáveis. 
         Considerando inadequada e financeiramente inviável a intervenção do Estado no sentido de estender a instrução a todas as classes, o deputado defendia uma solução certamente utópica, senão cínica: a escolarização dos pobres deveria depender das famílias que, por generosidade e sentimentos religiosos, se dispusessem a sustentá-los na qualidade de agregados. 


    

       O Dr. Manoel de Queiroz Mattoso Ribeiro, como vimos, desceu à sepultura há quase um século.  Suas ideias, contudo, alcançaram notável longevidade.  Sobrevivem nas palestras e livros de alguns publicistas que postulam a prioridade de um "ensino para as elites"; nas falas cotidianas dos cidadãos comuns que protestam contra a concessão de material escolar, merenda e transporte gratuitos "à turma que faz filho todos os anos", ainda que saibam que as taxas de natalidade no Brasil despencam há várias décadas; nas propostas dos políticos e lobistas que pretendem suprimir o ensino superior público, limitando as vagas universitárias aos capazes de "pagar bem", como diria Mattoso Ribeiro, com algumas exceções oferecidas aos bolsistas mais convenientes ao setor privado, numa atualização do programa de "caridade" sugerido pelo velho conservador. 
         A luta contra a concentração do saber, para as esquerdas, jamais pode sair da ordem do dia.         


1- Ver Almanak Laemmert, 1871, seção província, p. 3.
2- Ver Dados biográficos dos senadores do Rio de Janeiro, 1826-1997.  Brasília: Senado Federal, Secretaria de Informação e Documentação, 1997, p. 121.       

11 comentários:

  1. Agradeço pela presença, durante a última semana, dos leitores do Brasil, Estados Unidos, Portugal, Angola, Rússia, Polônia, Alemanha, Canadá, França e Reino Unido.

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  2. ei gustavo já pensou em fazer um texto sobre privatizações nazistas?muitos colegas me mandaram diversos links mas todos estavam em inglês.

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  3. Sugestão devidamente registrada. Não podemos negar à direita o seu maior "feito".

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    1. Deixa de ser mentiroso para achar um partido chamado Partido nacional socialista dos trabalhadores alemães observe isso.

      O Programa do Partido Nacional Socialista Alemão dos Trabalhadores (NSDAP) pode ser resumido em 25 pontos-chaves:
      - "Nós pedimos a constituição de uma Grande Alemanha, que reúna todos os alemães, baseados no direito dos povos a disporem de si mesmos.
      - Igualdade de direitos para o Povo Alemão em relação às outras nações e a revogação do Tratado de Versalhes e do Tratado de Saint Germain.
      - Terras e colônias para nutrir o nosso povo e reabsorver a nossa população.
      - Só os cidadãos gozam de direitos cívicos. Para ser cidadão, é necessário ser de sangue alemão. A confissão religiosa pouco importa. Nenhum judeu, porém, pode ser cidadão.
      - Os não cidadãos só podem viver na Alemanha como hóspedes, e terão de submeter-se à legislação sobre os estrangeiros.
      - O direito de fixar a orientação e as leis do Estado é reservado unicamente aos cidadãos. Por isso pedimos que todas as funções públicas, seja qual for a sua natureza, não possam ser exercidas senão por cidadãos. Nós combatemos a prática parlamentar, origem da corrupção, de atribuição de lugares por relações de Partido sem importar o caráter ou a capacidade.
      - O Estado se comprometa a proporcionar meios de vida a todos os cidadãos. Se o país não puder alimentar toda a população, os não cidadãos devem ser expulsos do Reich.
      - É necessário impedir novas imigrações de não-alemães. Pedimos que todos os não-alemães estabelecidos no Reich depois de 2 de Agosto de 1914, sejam imediatamente obrigados a deixar o Reich.
      - Todos os cidadãos têm os mesmos direitos e os mesmos deveres.
      - O primeiro dever do cidadão é trabalhar, física ou intelectualmente. A atividade do indivíduo não deve prejudicar os interesses do coletivo, mas integrar-se dentro desta e para bem de todos. É por isso que pedimos.
      - A supressão do rendimento dos ociosos e dos que levam uma vida fácil, a supressão da escravidão do juro.
      - Considerando os enormes sacrifícios de vidas e de dinheiro que qualquer guerra exige do povo, o enriquecimento pessoal com a guerra deve ser estigmatizado como um crime contra o povo. Pedimos por isso o confisco de todos os lucros de guerra, sem exceção.
      - A nacionalização de todas as empresas que atualmente pertencem a trusts. - Uma participação nos lucros das grandes empresas. - Um aumento substancial das pensões de reforma. - A criação e proteção de uma classe média sã, a entrega imediata das grandes lojas à
      administração comunal e o seu aluguer aos pequenos comerciantes a baixo preço. Deve ser dado prioridade aos pequenos comerciantes e industriais nos fornecimentos ao Estado, aos Länder ou aos municípios.
      - Uma reforma agrária adaptada às nossas necessidades nacionais, a promulgação de uma lei que permite a expropriação, sem indemnização, de terrenos para fins de utilidade pública – a supressão de impostos sobre os terrenos e a extinção da especulação fundiária.
      - Uma luta sem tréguas contra todos os que, pelas suas atividades, prejudicam o interesse nacional. Criminosos de direito comum, traficantes, agiotas, etc., devem ser punidos com a pena de morte, sem consideração de credo religioso ou raça.
      - O Direito romano seja substituído por um direito público alemão, pois o primeiro é servidor de uma concepção materialista do mundo.

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    2. - A extensão da nossa infra-estrutura escolar deve permitir a todos os Alemães bem dotados e trabalhadores o acesso a uma educação superior, e através dela os lugares de direção. Os programas de todos os estabelecimentos de ensino devem ser adaptados às necessidades da vida prática.O espírito nacional deve ser incutido na escola a partir da idade da razão. Pedimos que o Estado suporte os encargos da instituição superior dos filhos excepcionalmente dotados de pais pobres, qualquer que seja a sua profissão ou classe social
      - O Estado deve preocupar-se por melhorar a saúde pública mediante a proteção da mãe e dos filhos, a introdução de meios idôneos para desenvolver as aptidões físicas pela obrigação legal de praticar desporto e ginástica, e mediante um apoio poderoso a todas as associações que tenham por objetivo a educação física da juventude.
      - A supressão do exército de mercenários e a criação de um exército nacional.
      - A luta pela lei contra a mentira política consciente e a sua propagação por meio da Imprensa. Para que se torne possível a criação de uma imprensa alemã, pedimos que:
      - Todos os diretores e colaboradores de jornais em língua alemã sejam cidadãos alemães.
      - A difusão dos jornais não-alemães seja submetida a autorização expressa. Estes jornais não podem ser impressos em língua alemã.
      - Seja proibida por lei qualquer participação financeira ou de qualquer influência de não- alemães em jornais alemães. Pedimos que qualquer infração estas medidas seja sancionada com o encerramento das empresas de impressão culpadas, bem como pela expulsão imediata para fora do Reich os não-alemães responsáveis. Os jornais que forem contra o interesse público devem ser proibidos. Pedimos que se combata peã lei um ensino literário e artístico gerador da desagregação da nossa vida nacional; e o encerramento das organizações que contrariem as medidas anteriores.
      - A liberdade no seio do Estado para todas as confissões religiosas, na medida em que não ponham em perigo a existência do Estado ou não ofendam o sentimento moral da raça germânica. O Partido, como tal, defende o ponto de vista de um cristianismo positivo, sem todavia se ligar a uma confissão precisa. Combate o espírito judaico-materialista no interior e no exterior e está convencido de que a restauração duradoura do nosso povo não pode conseguir-se senão partindo do interior e com base no princípio: o interesse geral sobrepõe-se ao interesse particular.
      - Para levar tudo isso a bom termo, pedimos a criação de um poder central forte, a autoridade absoluta do gabinete político sobre a totalidade do Reich e as suas organizações, a criação de câmaras profissionais e de organismos municipais encarregados da realização dos diferentes Länder, de leis e bases promulgadas pelo Reich.

      Visto isso não sendo analfabeto não existe a menor chance de o Partido Nazista ser de direita, alias do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães,é uma questão de alfabetização

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    3. Privilégios estatais para os "bem dotados"- direita.

      Ensino superior pago, com patrocínio estatal para os pobres "excepcionalmente dotados"- direita.

      Imprensa sob gestão privada e fechada aos estrangeiros- fascismo- direita.

      Associação formal entre Estado e Cristianismo- direita.

      Ou será que não sei mais ler?

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  4. Expansionismo territorial associado ao colonialismo- direita.

    Igualdade puramente formal de direitos- liberalismo- direita.

    Gestão da economia por "pequenos comerciantes e industriais"- canto da sereia para pequenos burgueses- direita.

    Participação nos lucros das empresas- resquício liberal- direita.

    Supressão do imposto territorial- utopia pequeno burguesa- direita.

    Restrições à imigração de pessoas de "sangue diverso"- fascismo puro- direita.

    Gostei do humor involuntário do rapaz!

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  5. Pela desarticulação da primeira frase até calculo quem seja...
    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

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  6. "não existe a menor chance de o Partido Nazista ser de direita, alias do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães,é uma questão de alfabetização"

    O partido sucessor da ARENA se dizia Democrático Social. Seria o general Figueiredo mais um esquerdista?
    E o Cavaco Silva, líder do Partido Social Democrata português? Um sujeito nascido em um lugar chamado Boliqueime só pode mesmo ser de esquerda!
    Capotei de rir!!!

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  7. A desonestidade intelectual esquedista é que mais me deixa irritado,vejo virtude no racinio dialletico de Marx,trabalho alienado,superestruturas ideologicas para manutencao qualquer um ve que a exploração do trabalho pela burguesia realmente existe,mais a partir dai usar isso para cirar ditaduras assasinas,para unir o poder politico como o econômico para oprimir a população tornando ela refém do Estado,esse é o verdadairo socialismo união do poder econômico e politico para oprimir a populacao

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    1. O cidadão não consegue nem juntar as letras de maneira a se fazer entender, mas quer determinar o que é honestidade intelectual. Certamente vai ser cooptado, se já não foi, por alguma seita de birutas.

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