sábado, 8 de junho de 2013

O jornalismo selvagem contra o índio civilizado

     

      Diante da tentativa de demonização das populações indígenas brasileiras em proveito do agronegócio, em pleno curso e empreendida sem maiores sutilezas por vários setores da mídia burguesa ao longo das últimas semanas, julgo oportuno retornar ao tema, que abordei em texto datado de 18 de abril de 2012.

http://gustavoacmoreira.blogspot.com.br/2012/04/midia-capitalista-e-direitos-dos-indios.html

     Naquela ocasião, me referi às grotescas inverdades divulgadas na reportagem assinada por Leonardo Coutinho, Igor Paulin e Júlia de Medeiros, da revista Veja, a respeito dos tupinambás do sul da Bahia, aos quais os autores negaram a própria existência.  Poupando desgaste ao leitor, volto a copiar o trecho mais importante da maliciosa reportagem:

O baiano José Aílson da Silva é negro e professa o candomblé. Seu cocar é de penas de galinha, como os que se usam no Carnaval. Silva se declarou pataxó, mas os pataxós disseram que era mentira. Reapareceu tupinambá, povo antropófago extinto no século XVII. Ele é irmão do também autodeclarado cacique Babau, que vive em uma área que nunca foi habitada pelos tupinambás. Sua "tribo" é composta de uma maioria de negros e mulatos, mas também tem brancos de cabelos louros. 

     Contra a fábula do povo supostamente  extinto, apresentei uma única fonte escrita, retirada do relatório da presidência da Bahia de 1860:

http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/123/000035.html 

    Não resta dúvida de que a nota do presidente Ferreira Penna sobre os tupinambás sepulta a ridícula hipótese dos empregados da família Civita.  Porém, sou obrigado a reconhecer uma severa falta de eficácia. Somente 222 pessoas, até o dia de hoje, leram a minha composição de 14 meses atrás, enquanto provavelmente centenas de milhares tiveram acesso à inconsistente peça elaborada pelo trio mencionado. 
     Trago então outras informações, com mais ênfase, no intuito de demonstrar até que ponto pode avançar aquela modalidade de jornalismo na ânsia de fazer prevalecer as versões mais convenientes aos setores dominantes, seus aliados e patrocinadores.  Através de rápidos apelos ao Dr. Google, sozinho, levantei há poucas horas estes novos resultados.  Penso que nem um aluno de oitavo ano do Ensino Fundamental acreditaria que falta a um setor tão provido de recursos quanto a redação de Veja capacidade operacional para fazer pesquisa semelhante antes de trazer ao público generalizações falsas.   
    O Supremo Tribunal Federal apreciou em 2 de maio de 2012 uma ação movida pela FUNAI em prol dos interesses dos índios pataxós do Sul da Bahia, sendo relator o ministro Eros Grau.      
   



    Na página sete do relatório podemos ler, com a grafia da época, trechos de uma lei estadual do ano de 1926, pela qual ficavam assegurados direitos territoriais tanto de pataxós quanto de tupinambás.  Portanto, outra vez fica patente o reconhecimento, por parte do  governo baiano,  da existência da etnia tupinambá, agora em fins da Primeira República. 




    A historiografia contemporânea reforça esta certeza.  A antropóloga portuguesa Susana de Matos Viegas publicou em 2007 uma extensa obra, específica sobre os tupinambás do município baiano de Olivença, cujo texto infelizmente não consegui baixar por inteiro.
     

     Todavia, o índice apresentado deixa claro que a autora efetuou um levantamento histórico que abrangeu diversas conjunturas locais no decorrer do século XX.



     O site mantido pelos pataxós ratifica a informação trazida por Viegas de que um líder chamado Marcelino guiou os tupinambás em seus enfrentamentos com fazendeiros e autoridades do estado na década de 1930.   



Os Tupinambá, em geral referidos sob a denominação Índios de Olivença, chegaram à Reserva em 1936, liderados pelo índio Marcelino, em busca de refúgio contra as perseguições sofridas na região do seu antigo aldeamento. 

      Não se sustenta nem ao menos a afirmativa de que os tupinambás de hoje são negros ou brancos, que aliás depende da premissa estúpida de que uma identidade étnica é determinada por aspectos fenotípicos.   Consultando a iconografia disponível na Internet, vemos nitidamente entre aqueles índios do sul da Bahia muitas das características físicas do habitantes originais do continente americano:   

                                       http://www.interiordabahia.com.br/p_cultura/3769.html






http://www.ibahia.com/detalhe/noticia/indios-do-sul-da-bahia-podem-receber-indenizacao-por-demora-na-demarcacao-de-terras/                                       




             Encerrada esta segunda excursão, me abstenho de formular qualquer juízo de valor sobre a revista Veja. 
 É de todo desnecessário.  Peço apenas aos amigos do blog um piso de duas mil visualizações. Estamos combinados?              

4 comentários:

  1. Parabéns Gustavo! Como sempre inteligentíssimo!
    Sebastiana

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  2. Aproveitando a chegada da nossa amiga Sebastiana, viva os índios puris do estado do Rio!

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  3. Ao "S": a raiva dos Civita não deve dar margem a comentários antissemitas que não publicarei. Se alguns judeus se encaixam no perfil abominável que você traçou, muitos outros foram intelectuais socialistas e/ou lutadores em tempo integral pelos direitos dos trabalhadores.

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  4. Gustavo, eu quis ironizar o preconceito dos Civita relação aos índios.
    Acho vergonhoso um grupo discriminado historicamente querer discriminar outra minoria discriminada historicamente.
    Judeus e Indios foram vitimas de holocaustos.

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